Abertura Carnaval, op. 92

Antonín DVORÁK

Na década de 1870, quando o compositor boêmio de trinta e poucos anos Antonín Leopold Dvořák (1841–1904) recebeu um prêmio do governo austríaco destinado a ajudar jovens artistas em início de carreira, os juízes eram o regente da Ópera de Viena, Johann Herbeck (1837-1877), e o crítico Eduard Hanslick (1825-1904). Com a saída de Herbeck, no mesmo ano, seu posto foi ocupado por ninguém menos que Johannes Brahms (1833-1897). Dvořák acabou ganhando o prêmio por mais três anos seguidos, o que permitiu que Hanslick e Brahms passassem a conhecer melhor sua obra. Começava, para os três, uma longa e feliz amizade. Hanslick e Brahms não se cansavam de convidar Dvořák a deixar a provinciana Praga e tentar a vida na cosmopolita Viena, onde sua música poderia atingir um público maior. Mas o custo de vida em Viena era muito alto e, além disso, seu coração era nacionalista, ele amava a cultura da Boêmia. Anos depois, em 1896, quando Dvořák, já mundialmente famoso, voltava de sua estadia de quatro anos nos Estados Unidos, Brahms ainda desejava ter seu amigo vivendo em Viena: “veja bem, Dvořák, você tem muitos filhos, e eu não tenho praticamente ninguém que dependa de mim. Se você precisar de alguma coisa, minha fortuna está a seu dispor”. Dvořák ficou imensamente comovido, mas jamais aceitaria a oferta. No ano seguinte, ele voltaria a Viena para o funeral de Brahms. Acabara de perder um grande amigo.

 

Dvořák foi, ao lado do também boêmio Bedřich Smetana (1824-1884), e do morávio Leoš Janáček (1854-1928), um dos principais representantes da chamada corrente nacionalista do período romântico, em um momento em que ser nacionalista, na Boêmia e na Morávia, era a última coisa que se esperava de uma pessoa antenada com a moda. As províncias da Boêmia e Morávia encontram-se no território da atual República Tcheca. Na segunda metade do século XIX, para os habitantes da periferia do Império Austro-Húngaro, a relação com a cultura local era bastante complicada. A língua e costumes locais eram vistos como primitivos e inferiores, e relegados apenas aos incultos, aos pobres e aos moradores do campo. Nas cidades grandes respiravam-se os ares de uma cultura tida como superior e desenvolvida, a cultura germânica. Falava-se o alemão nas repartições públicas e nos círculos sociais, praticavam-se os costumes alemães nas casas de boa família.

 

Dvořák começou a compor nos seus anos de estudante, em Praga. Suas composições, contrariando a germanização da cultura local, eram salpicadas com um certo tempero local. A música folclórica da Boêmia e da Morávia, que Dvořák aprendera cedo com o pai, seria sua fonte de inspiração ao longo de toda a vida. A Abertura Carnaval, esta obra exuberante e alegre, cheia de energia e vitalidade, é repleta de influências folclóricas e ritmos de danças tchecas. Como em muitas de suas obras, Dvořák evitou utilizar elementos retirados diretamente da música folclórica. Preferiu compor melodias e ritmos inspirados no folclore e integrá-los à idéia tradicional da abertura italiana. Segunda de três aberturas que Dvořák compôs nos anos 1891-1892, a Abertura Carnaval foi estreada em Praga, no dia 20 de abril de 1892, sob a regência do próprio compositor.

 

Guilherme Nascimento

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