|    12 ago 2020

Maestro indica: “Choros nº 6” de Villa-Lobos

Maazel conduz na cadência de Villa

Maazel conduz na cadência de Villa

por Fabio Mechetti

Li recentemente que, numa enquete feita por um dos tradicionais jornais do Brasil, destinada a medir a familiaridade de certos grandes nomes da inteligência brasileira, somente 5% das pessoas entrevistadas sabiam quem havia sido Heitor Villa-Lobos. Sem entrar no mérito de como podemos ler esse triste resultado, o fato é que a obra de Villa-Lobos, mesmo dentre aqueles que se consideram aficionados da música clássica, continua a ser vastamente ignorada.

Em parte, devemos isso ao fato de que muitas de suas obras, principalmente as sinfônicas, sofrem com edições ilegíveis, repletas de erros gráficos e, muitas vezes, difíceis até de ser encontradas para compra ou aluguel. E, por isso, não são programadas com a frequência que merecem. Alguns desses problemas estão sendo recentemente aliviados com a publicação de várias peças profissionalmente revisadas e editadas e com a obtenção, para o Museu Villa-Lobos, dos direitos autorais que pertencem a editoras estrangeiras. Seja qual for a razão, a verdade é que nosso maior compositor ainda é desconhecido por 95% dos brasileiros…

A obra de Villa-Lobos é vastíssima. Cerca de mil peças que exploram desde a suavidade e intimidade de um violão até obras sinfônicas monumentais, alguns até diriam megalomaníacas. Seu material é o rico folclore brasileiro, por ele coletado ao longo dos anos e refletido em sua música de maneira direta, mas, ao mesmo tempo sofisticada.

Suas Bachianas, principalmente a de número 5, são talvez as obras mais conhecidas, mas creio que é na diversidade de seus Choros que a originalidade e flexibilidade de Villa-Lobos se manifestam mais profundamente. São quatorze peças escritas na década de 1920, que, ilustrando exatamente aquilo que descrevi acima, vão desde uma peça para violão (Choros nº 1) ou piano solo (nº 5) até obra para banda e duas orquestras (nº 13), embora esta última tenha se perdido no tempo ou simplesmente sido abandonada.

Dentre os Choros, aquele que mais descreve a genialidade de Villa-Lobos é o de número 6, escrito em 1926 para orquestra. Nele, identificamos a facilidade melódica, a energia rítmica, o apego às raízes folclóricas de seu país, o aceno ao passado e o descortinar de novos caminhos para a música brasileira que o compositor carioca tinha. É difícil pensar, por exemplo, nas qualidades musicais atribuídas à Bossa-Nova, sem Villa-Lobos a ter “antecipado” neste sexto Choro (ouçam o trechinho que se inicia no minuto 15:35)

Como venho indicando links do YouTube que tenham tanto áudio quanto vídeo, não tenho como indicar a melhor gravação dos Choros nº 6, a da Filarmônica de Minas Gerais feita para o selo Naxos, pois só existe o áudio (álbum Villa-Lobos, Guitar Manuscripts vol. 2, selo Naxos, ouça no Spotify).

Dentre as opções em vídeo que temos disponíveis, vou recomendar uma gravação ao vivo de um concerto realizado pela Orquestra Filarmônica Mundial, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, composta por profissionais selecionados em várias orquestras internacionais (incluindo o lendário percussionista Bituca, na época membro da Orquestra Sinfônica Brasileira). A qualidade sonora e visual é pobre, mas é um dos poucos exemplos que temos de um regente não brasileiro com uma orquestra não brasileira executando um compositor brasileiro. Além disso, este deve ser o único exemplo registrado de Lorin Maazel (um dos regentes mais carrancudos da história da música) rindo, e até dançando, ao não conseguir resistir à tentação de nosso samba (minuto 7:30).

A imagem deste post é uma ilustração de Mariana Simões.

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