A força do destino

Giuseppe VERDI

Giuseppe Verdi (1813-1901) nasceu em Roncole, na Itália, filho de um estalajadeiro. Criança de poucos meses, só escapou da morte porque sua mãe escondeu-se com o menino no campanário da igreja, enquanto os soldados austríacos, reocupando a Itália, perpetravam um massacre entre os moradores da aldeia. Muito cedo, Verdi demonstrou notáveis aptidões musicais e, aos nove anos, já era o organista da igreja local, substituindo o pároco aldeão. Um mecenas, Antonio Barezzi, abastado comerciante de Busseto, cidade próxima de Roncole, resolve custear a educação do jovem Giuseppe, enviando-o para Milão. Barezzi tornou-se, depois, sogro do compositor e foi seu admirador por toda a vida.

 

Em 1836, Verdi escreve sua primeira ópera, Oberto. Apresentada em 1839, no La Scala, obteve êxito suficiente para que o compositor recebesse a encomenda de mais três óperas. Mas ao fracasso de Un Giorno de Regno (1840) soma-se uma série de tristes acontecimentos. Em um pequeno espaço de tempo, morrem seus dois filhos e a esposa. Desolado, Verdi pensa em abandonar a carreira operística e voltar para sua cidade. Mas, persuadido pelo empresário Merelli e pela cantora Giuseppina Strepponi (que será sua companheira por cinqüenta anos), o compositor escreve Nabucco, para uma montagem no La Scala (1842). A nova ópera estrea como o maior sucesso na história desse teatro. Os coros de Nabuco eram cantados pelas ruas de Milão. A Itália do Risorgimento, no momento de luta pela sua independência e unificação, encontrava, finalmente, o compositor símbolo de seus ideais patrióticos, aquele cuja estética correspondia às mais profundas aspirações de seu povo. O próprio nome do músico tornou-se um emblema revolucionário, pois o povo, aproveitando habilmente as letras que o compunham, escrevia nos muros das cidades o dístico Viva Verdi, que todos decifravam como Viva Vittorio Emanuele Re D’Italia.

 

Na década de 1850, sua fama consolida-se e torna-se internacional com a trilogia das óperas Rigoletto (1851), Il Trovatore (1853) e La Traviata (1853). Era um homem célebre, portanto, quando aceitou o convite do Teatro Imperial de São Petersburgo para escrever A força do destino, sobre um drama do escritor Angel Saavedra. O libreto de Francesco Piave, colaborador habitual de Verdi, manteve-se muito fiel ao original, com muitas passagens traduzidas literalmente do espanhol. A obra estreou na Rússia, em 1867. Entretanto, insatisfeitos com o resultado, o compositor e o libretista iniciaram uma segunda versão (1869), modificando, sobretudo, o princípio e o final da ópera.

 

A Abertura, extremamente dramática, substitui o pequeno prelúdio da versão russa e tornou-se uma das peças mais ouvidas do compositor. Principia com um motivo nos metais e fagotes, breve anúncio carregado de sinistros presságios. Impulsionado pelas cordas, o Tema do Destino, associado à triste sina de Leonora, aparece ameaçador e angustiado. Com ele alternam-se outros motivos destacados da ópera: o do dueto de Don Álvaro e Don Carlos (IV ato) apresenta-se com a flauta, o oboé e a clarineta; um vigoroso allegro con fuoco envolve toda a orquestra e sugere a explosão das batalhas; o Tema da Esperança, do grande dueto de Leonora e do padre guardião (II ato), surge apresentado pela clarineta. A força dramática dessa fulgurante Abertura reside na habilidade do compositor de entrelaçar todos esses motivos, variando-os e intercalando-os com fragmentos melódicos, em contrastes repletos de simbolismo.

 

Na ária Pace, pace, mio Dio, do IV ato, Leonora, mesmo disposta a confinar-se e isolar-se do mundo, sabe que seu amor e sua culpa não lhe abandonarão neste mundo. Suplica então a Deus pela paz de espírito, junto à caverna onde cumprirá a penitência como eremita: “Fazei que eu morra, pois só a morte pode dar-me calma. Esta alma, presa de tanta dor, em vão, esperou a paz”.

 

Verdi escreveu, ao todo, 26 óperas, além de música religiosa e coral, incluindo uma Ave Maria, o Te Deum e o Stabat Mater. Manteve-se criativo e inovador até a velhice.

 

Após a estreia de Aída (1871, encomendada para as festas da inauguração do canal de Suez) e do magnífico Réquiem (1874), o compositor, famoso e cansado, retira-se para a calma de sua chácara em Santa Ágata. Parecia o fim de uma carreira gloriosa, quando, depois de uma década de silêncio, Verdi surpreende o mundo musical com suas duas últimas óperas, ambas baseadas em Shakespeare: Otello (1887), sua maior tragédia, e Falstaff (1893), uma ópera cômica. São obras primas de um velho sábio. Nelas, o compositor octogenário abandona os procedimentos consagrados de suas óperas anteriores e evolui para um estilo corajosamente inovador. Verdi morreu em janeiro de 1901, quando começava o século XX. Atualmente, é o mais representado dos compositores de ópera.

 

Paulo Sérgio Malheiros Santos

anterior próximo