Abertura concertante

Camargo GUARNIERI

(1942)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos, cordas.

 

Camargo Guarnieri nasceu em 1907, na cidade de Tietê, no estado de São Paulo. Iniciou sua educação musical na infância – o pai era flautista e a mãe, pianista. Em 1923 mudou-se para São Paulo, em busca de melhores oportunidades para sua formação musical. Em 1938, Guarnieri teve oportunidade de realizar estudos musicais na França, com Charles Koechlin, um importante professor de contraponto, composição e instrumentação. Na França, conheceu também Nádia Boulanger, uma figura central da corrente musical neoclássica.

 

Guarnieri sofreu a influência decisiva da Semana de Arte Moderna (1922), identificando-se como um compositor essencialmente nacionalista. Apresentou suas primeiras obras a Mário de Andrade, um dos mais importantes intelectuais da época, que se tornou seu mentor. Guarnieri frequentava a casa de Mário de Andrade, com quem discutia estética e ouvia obras musicais. Mário foi um crítico severo das correntes musicais que não se alinhavam com o nacionalismo. Sua obra O Banquete apresenta um típico compositor brasileiro – Janjão – que foi identificado com Camargo Guarnieri. Em seu Ensaio sobre a música brasileira, Mário de Andrade discorre sobre as características de uma música genuinamente brasileira e estabelece os elementos que deveriam estar presentes nas composições, para assegurar um cunho nacional. A influência militante de Mário refletiu-se na posição assumida publicamente por Guarnieri por ocasião de sua ruptura com Koellreutter, em 1950. Pode-se dizer que, após essa ruptura, houve uma separação entre a corrente da música nacionalista e a da música de vanguarda, que utilizava a técnica dodecafônica e o atonalismo. Koellreutter fez uma leitura diferente das propostas de Mário de Andrade: por um lado, considerava de fundamental importância as suas preocupações com a dimensão social da música; por outro, no plano técnico, ao contrário de Mário, considerava igualmente importante a superação da tonalidade e dos elementos nacionalistas.

 

A partir da década de 1940, Guarnieri visitou os Estados Unidos em diversas oportunidades e recebeu vários prêmios. Ele é, atualmente, o segundo compositor brasileiro mais executado no mundo, superado apenas por Villa-Lobos.

 

A Abertura Concertante foi composta em 1942 e está dedicada ao compositor americano Aaron Copland. Sua estreia se deu em 2 de junho de 1942, no Teatro Municipal de São Paulo, sob a regência do maestro João de Souza Lima.

 

A peça apresenta características neoclássicas combinadas a elementos rítmicos e harmônicos nacionalistas. Segue um esquema formal de tipo ABA (Rápido Lento Rápido).

 

Na parte inicial, há um motivo principal que retorna incessantemente, caracterizado por um ritmo vigoroso. Está instrumentado com uníssono orquestral e pontuações do tímpano. No decorrer da seção, esse motivo retorna com variações de ritmo, instrumentação e harmonia. Há diversos diálogos entre grupos de instrumentos, impulsionando a música que gira ao redor de uma mesma ideia, mas que, a cada vez, é iluminada por uma coloração particular.

 

Na parte central, lenta, surge um tema melódico com características modais, que se repete inúmeras vezes, sofrendo alterações sutis de harmonia e instrumentação. É interessante observar que esse tema é acompanhado, em contraponto, por variações lentas do motivo da parte inicial, o que demonstra a preocupação do compositor com a consistência formal. Particularmente interessante é o início dessa seção lenta, onde ouve-se o ralentar do motivo inicial que mergulha, progressivamente, para o fundo da textura, enquanto se inicia a melodia modal nos violinos, em terças paralelas.

 

Após a segunda seção, o material inicial retorna sem alterações, a não ser em seu final, quando se ouve uma coda densa e brilhante.

 

Rogério Vasconcelos
Compositor e professor da Escola de Música da UFMG.

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