Bachianas Brasileiras nº 9

Heitor VILLA-LOBOS

(1945)

Instrumentação: cordas

 

“Não sou um folclorista. O folclore não domina meu pensamento. Minha música é como eu a sinto. Não saio à caça de temas com intenção de usá-los. Componho com o espírito de quem faz a própria música.” Villa-Lobos afirma, com essas palavras, sua diferença em relação às ideias de Mário de Andrade e dos compositores nacionalistas de sua geração, ocupados em criar uma música brasileira baseada no folclore. Personalidade controvertida, Villa-Lobos é um dos mais importantes compositores das Américas no século XX. Sua força criativa e capacidade de trabalho possibilitaram-lhe realizar uma extensa e diversificada obra.

 

Sua intimidade com o choro e outras manifestações musicais urbanas está presente em várias de suas obras, notadamente nos Prelúdios e Estudos para violão solo e nos quatorze Choros para formações instrumentais diversas. Apesar de compor uma música presa aos princípios da tonalidade clássica e de sua conhecida aversão ao atonalismo, seu pensamento não é linear. Frequentemente, sua música se afasta dos procedimentos tradicionais; ela é, antes, um painel de cores, melodias, ritmos e harmonias, recortados e colados com intuição e originalidade. Essa forma de pensar o aproxima de Debussy e, em particular, de Stravinsky.

 

Entre suas obras mais conhecidas estão as nove Bachianas Brasileiras, escritas entre 1930 e 1945 como uma homenagem a Bach. Villa-Lobos permaneceu ao longo de toda a vida próximo à obra de Bach, com quem dizia ter uma ligação espiritual, e realizou inúmeros arranjos de seus prelúdios e fugas para coro misto, conjuntos de violoncelos e também orquestra. Nas Bachianas, no entanto, não há citações diretas à obra do compositor alemão, mas sim uma constante utilização do contraponto e de procedimentos típicos do Barroco e do estilo bachiano, tais como o uso de melodias com motivos recortados em progressões.

 

Bachianas Brasileiras nº 9, na verdade um prelúdio e fuga para orquestra de cordas, foi estreada por Eleazar de Carvalho, em novembro de 1948, regendo a Orquestra Sinfônica Brasileira. No Prelúdio: Vagaroso e místico, a melodia inicial, acompanhada por um pedal longo, antecipa o tema da fuga com ritmo modificado e valores aumentados. O caráter introdutório é claramente delineado ao longo desse movimento e, pouco a pouco, atinge uma textura mais densa, com utilização de registros extremos e maior volume sonoro. O tema da Fuga, apresentado nos violoncelos, utiliza um curioso compasso onze por oito, o que acentua seu caráter rítmico. A fuga, forma polifônica típica do Barroco, é tratada por Villa-Lobos de forma bastante livre. Esse movimento se caracteriza por três grandes seções. Na primeira o tema é exposto e imitado de forma constante em diferentes instrumentos. Segue-se um Divertimento em que o compositor desenvolve e transforma o tema inicial, dialogando com uma melodia nos violinos, uma espécie de segundo tema estruturado em progressões descendentes. Na última parte, o tema é reapresentado, e uma cerrada polifonia imitativa conduz paulatinamente à conclusão da obra.

 

Rubner de Abreu
Professor da Fundação de Educação Artística, criador e diretor do grupo Oficina Música Viva.

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