Concerto para piano nº 1

Claudio Santoro

(1952)

Instrumentação: Piccolo, 2 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, contrafagote, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, cordas.

 

O compositor manauense Claudio Santoro completa em 2019 o centenário de seu nascimento e o trigésimo ano de sua morte. Iniciou-se na composição aos dezenove anos e, aos 21, travou contato, no Rio de Janeiro, com Hans-Joachim Koellreutter, mestre que delinearia seu primeiro período composicional, a fase dodecafônica (1939-1946). Após curto período de transição (1946-1948), sua produção musical passou à fase nacionalista (1949-1960), fruto de estudos com Nadia Boulanger, em Paris, e da participação no II Congresso de Compositores e Músicos Progressistas de 1948, em Praga. A partir daí, o compositor simplificou sua linguagem: “a forma e o conteúdo da música devem expressar o entusiasmo do nosso povo, suas lutas, suas esperanças”. Sua arte, de forma geral, refletiu as transformações vivenciadas no século XX, se metamorfoseou esteticamente – ora por questões políticas e sociais, ora pelo contato com diferentes correntes vanguardistas –, mas sempre com indubitável qualidade técnica e mestria. “Assim como Stravinsky na música ou Picasso na pintura, ele não se conteve em se acomodar em uma linha estética única de expressão e pensamento”, observou o maestro Fabio Mechetti acerca da polivalência musical de Santoro.

 

Santoro compôs três concertos para piano e orquestra: o nº 1, concluído em 1952, no Rio de Janeiro; o nº 2, composto entre 1958 e 1959, em Viena; e o nº 3, escrito em 1960, na Bulgária. O Concerto nº 1 situa-se cronologicamente entre duas importantes obras para piano solo, as Dansas Brasileiras (1951) e as sete Paulistanas (1953), as primeiras dedicadas ao casal Jeannette e Heitor Alimonda, amigos íntimos do compositor. Foi Alimonda – pianista responsável por estrear o Concerto nº 1 a 10 de abril de 1953, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, sob a regência de Eleazar de Carvalho – o mais fiel e assíduo intérprete de Santoro e é o dedicatário desta obra e de outras, a citar a Sonata nº 3 para piano, de 1955.

 

O primeiro movimento, Choro, ambienta mais danças africanas e indígenas do que a melancólica música popular urbana denominada no título. Pode-se associar os trechos rápidos à dança do cateretê e os trechos lentos ao lundu, gênero africano precursor do choro e do samba. Uma característica do lundu são os paralelismos melódicos em terças – que introduzem o movimento através das trompas e clarinetes. O ritmo se acelera até a aparição do ganzá e do piano solista. O ganzá, um tipo de chocalho, assim como a participação ativa da percussão, dará vitalidade ao movimento.

 

O segundo movimento, Moda, introduzido por um longo solo de piano, faz jus à versão abrasileirada da suíte europeia sugerida por Mario de Andrade. Segundo ele, a moda ou modinha substituiria a ária instrumental, assim como o ponteio substituiria o prelúdio. No movimento final, Allegro, Santoro exibe seus talentos de sinfonista, retorna ao uso da percussão e inclui síncopes e batuques na linha do piano. A cadenza do solista, perto do final, é um dos pontos altos desta obra singular – uma dentre 28 obras para orquestra e instrumento solista que Santoro compôs. E, revivendo a sua música, celebremos, da melhor maneira, um compositor nacional de elevada estirpe.

 

Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.

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