Concerto para violino em mi menor, op. 64

Felix MENDELSSOHN

(1844)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos e cordas.

 

Neto do filósofo Moses Mendelssohn, importante figura do Iluminismo alemão, Felix Mendelssohn recebeu educação sofisticada e musicalmente abrangente, obtendo grande sucesso como regente, pianista e compositor. Maestro audacioso, reapresentou a Paixão segundo São Mateus de Bach, exatamente um século após sua primeira audição; executava frequentemente os concertos para piano de Mozart e Beethoven; revelou ao público a Grande Sinfonia em Dó Maior de Schubert e divulgou a música renovadora de seus contemporâneos, com primeiras audições de Schumann e Berlioz, entre outros compositores de seu tempo.

 

Sua trajetória marcou-se pela precocidade: antes dos dezenove anos, Mendelssohn já compusera muitas de suas mais importantes obras, principalmente para a música de câmara, e a célebre abertura de Sonho de uma noite de verão. O talento precoce sedimentou-se com inusitada formação musical, viabilizada por um privilegiado ambiente familiar e por viagens de estudos. Aluno de grandes mestres, amigo próximo do velho Goethe, o jovem pianista soube escolher seus modelos musicais, principalmente o Beethoven da última fase. Nasceram assim vários quartetos de cordas e o admirável Octeto, escrito aos dezesseis anos. Longe de mera imitação, essas obras surpreendem pela originalidade – quanto mais se percebem as influências, maior a qualidade do resultado.

 

Por outro lado, o apego ao melhor cânone da música ocidental fez o compositor menos ousado que o regente. Mesmo em suas composições mais originais e a despeito de um agradável colorido romântico, ele se manteve ortodoxamente apegado a esse passado, ainda recente. Entretanto, a clareza das formas, a elegância da escrita, a suavidade das melodias e a engenhosidade de composição dessas muitas obras-primas afastam-no da mediocridade dos mendelssohnianos, que, no final do século XIX, transformaram o Conservatório de Leipzig – instituição fundada pelo compositor – em uma fortaleza do academismo.

 

O Concerto para violino op. 64 tem três movimentos.

 

O Allegro molto appassionato inicial traz uma novidade formal extremamente bem-sucedida e de efeito irresistível, ao deslocar a cadenza, do final do primeiro movimento para a transição entre o desenvolvimento e a reexposição dos dois temas. Com esse procedimento inovador, a cadenza transforma-se, de simples exibição virtuosística em elemento constituinte da forma.

 

O Andante tem a forma de um lied ternário. Com caráter sonhador e sentimental, fornece ao instrumento solista belas frases longas e de delicadas ondulações.

 

O terceiro e último movimento, Allegretto non tropo – Allegro molto vivace, traz o espírito de um rondó, na forma sonata. O diálogo entre o solista e a orquestra torna-se mais cerrado, construindo um jogo virtuosístico que, em sua espontaneidade, jamais se mostra superficial.

 

Terminado aos 35 anos, este Concerto foi dedicado ao violinista Ferdinand David, que o estreou, sob a regência do compositor dinamarquês Niels Gade, em 1845. Mendelssohn, entretanto, só o ouviria um mês antes de sua morte, em 1847, interpretado por Josef Joachim.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.

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