Pinheiros de Roma

Ottorino RESPIGHI

(1924)

Instrumentação: piccolo, 3 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, contrafagote, 6 trompas, 4 buccine, 5 trompetes, 5 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, piano, celesta, cordas.

 

Numa Itália sufocada pelo fascismo, que permitia apenas a exaltação das tradições e cerceava a livre criação musical; e num cenário musical preponderantemente operístico, dominado pelos compositores veristas, “a geração de oitenta” – à qual pertenceu Respighi – surgiu e se manteve – em meio às mais diversas crises – na luta pela renovação do gosto musical italiano. Na tentativa de conciliação, se orientaram por uma curiosidade pelo novo, pelas vanguardas e pela pesquisa do antigo, do tradicional. Em resposta ao gosto musical italiano, entregue por muito tempo à produção operística, propunham a reabilitação da arte instrumental italiana.

 

Ottorino Respighi, inicialmente aluno do Liceo Musicale de Bologna, estudou orquestração com Rimski-Korsakov em São Petersburgo e composição com Max Bruch em Berlim. Tornou-se professor na Academia Santa Cecília em Roma e se deixou influenciar por Debussy e Richard Strauss. Sua poética tentava amenizar o verismo triunfante, articulando-o com as tradições musicais (velhos modos de cantochão, música italiana dos séculos XVI e XVIII), com a influência de algumas novas correntes e o espírito reformista. Acabou por criar uma espécie de mistura pós-romântica e impressionista, de tendência neoclássica. Sua produção desafia uma linha classificatória.

 

Fontes de Roma, Pinheiros de Roma e Festas Romanas compõem a trilogia romana. Os três poemas sinfônicos, gênero de grande destaque em Respighi, evidenciam suas características – a esplêndida orquestração e a elegância e riqueza da escrita, o refinamento de harmonia e timbre – que contribuíram para a conformação de um modelo italiano de poema sinfônico. Sente-se uma preferência pelas formas amplas e estruturas imponentes. Pinheiros de Roma, sua obra mais conhecida, divide-se em quatro partes executadas sem interrupção – um movimento vivo, dois lentos e um em ritmo de marcha. Escrita em 1923, a obra sugere uma reconstrução de impressões visuais e sonoras de diferentes regiões de Roma. A própria partitura faz algumas alusões a isso. As quatro partes são:

1. Pinheiros da Villa Borghese: brincadeiras de crianças entre os pinheiros, segundo o argumento fornecido pelo autor. Danças e rodas: orquestra de sonoridades claras e densas, dentre as quais as estridências do trompete. “Todos se embriagam de gritos como os das andorinhas ao anoitecer; e acabam por fugir em bando.”

2. Pinheiros próximos a uma catacumba: os registros graves da orquestra sugerem a sombra que os pinheiros projetam sobre a entrada de uma catacumba. Um trompete longínquo, sobre o lento movimento das cordas, evoca um calmo e misterioso local. Um canto salmodiado das profundezas sepulcrais “se espalha solene como um hino e se desvanecendo”.

3. Os pinheiros do Janículo: nova paisagem e nova atmosfera, limpidez noturna. “Os pinheiros do monte Janículo perfilam-se à luz de uma lua serena…”. Breve cadência ao piano, depois revezada pelo clarinete, retomada a seguir pelas cordas e, finalmente, por toda a orquestra. Canta um rouxinol (a partitura original prevê um canto de pássaro gravado do original, por gramofone).

4. Os pinheiros da Via Appia: evocadora da Roma antiga. O campo trágico é velado por pinheiros solitários. As sombras desaparecem de repente e vem a explosão sonora das buzinas com a visão gloriosa de um exército consular: “A subida triunfal ao Capitólio”.

 

Igor Reyner
Pianista, Mestre em Música pela UFMG, doutorando de Francês no King’s College London e colaborador do ARIAS/Sorbonne Nouvelle Paris 3.

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