Sinfonia nº 7 em Dó maior, op. 105

Jean SIBELIUS

(1924)

Instrumentação: 2 piccolos, 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tímpanos, cordas.

 

Jean Sibelius é conhecido universalmente, hoje em dia, principalmente por suas sete sinfonias e pelo concerto para violino. Exageradamente considerado, pela crítica, como um compositor nacionalista, Sibelius foi, na verdade, um compositor cosmopolita, atento às transformações musicais de seu tempo, mas sempre fiel ao seu estilo. Sua obra tem sido vista, recentemente, como comparável à de Gustav Mahler, ambos responsáveis por uma grande ampliação do gênero sinfônico no início do século XX. A chave para se conhecer as sinfonias de Sibelius está exatamente onde elas diferem das de Mahler. Se para Mahler a sinfonia deveria expandir-se ao ponto de abarcar o mundo, para Sibelius ela deveria conter apenas o essencial: a concentração máxima da forma com uma elevada economia de material.

 

Assim que o século XX se iniciou, o estilo de Sibelius foi considerado como um prolongamento do Romantismo, o que fez com que sua música fosse vista como moderna pelo meio musical da França, Alemanha e Áustria. Porém, em dez anos essa mesma característica o condenaria ao rótulo de retrógrado. Sibelius não era nem moderno nem retrógrado, mas sabia tratar os elementos musicais, já assimilados de longa data, de maneira ímpar, dando-lhes um frescor inusitado. Era excepcional a sua capacidade de retrabalhar aspectos largamente conhecidos, tais como a melodia, a harmonia e a trama orquestral, e dar-lhes uma aparência nova. Nos anos 1920 sua popularidade – na França e nos países de língua germânica – havia declinado consideravelmente, enquanto, curiosamente, estava em franca ascensão nos países de língua inglesa. Enquanto França, Alemanha e Áustria travavam uma batalha política pela hegemonia da modernidade nas artes, os círculos mais conservadores dos Estados Unidos e Inglaterra viam a música de Jean Sibelius como uma via de escape para as tendências modernistas que assolavam a Europa. A composição de sua Sétima Sinfonia se deu justamente nessa época. Terminada em 1924, foi estreada em Estocolmo, em 24 de março do mesmo ano, sob a regência do compositor. Calorosamente recebida pelo público escandinavo e, mais tarde, pelo inglês e o norte-americano, foi praticamente ignorada pelos países da Europa central.

 

Embora a primeira menção à Sétima Sinfonia tenha ocorrido em uma carta de Sibelius de 1818 – em que se descobre que o plano original da obra contemplava três movimentos –, fragmentos do material musical utilizado na Sinfonia podem ser encontrados em cadernos de rascunhos do compositor desde o ano de 1914. Em 1923 o compositor condensou os três movimentos em um único. O resultado, entretanto, está longe de parecer uma simples colagem. Sibelius conseguiu construir uma estrutura complexa ao utilizar aquilo que se convencionou chamar de forma rotacional ou forma cíclica. A forma rotacional opera por constantes reaparições variadas do mesmo material musical. Ou seja, cada vez que determinado trecho musical reaparece, ele traz consigo transformações (expansões, condensações, reordenações etc.) e acúmulo, ou subtração, de materiais. O resultado sonoro assemelha-se ao aparecimento de constantes flashbacks que se acumulam inusitadamente, como um passado que insiste em retornar constantemente, porém diferente.

 

A obra possui quatro seções intercaladas pelo tema do trombone. Na primeira seção (Adagio) Sibelius expõe o material principal: o rufo dos tímpanos, a escala ascendente das cordas e o motivo das flautas (respondido pelos clarinetes). Um curto momento em que as cordas tocam pequenos motivos, em imitação, culminará na primeira aparição do tema do trombone. Uma longa transição, com rotações livres dos materiais do início, acelera o tempo até chegarmos à próxima seção. Na segunda seção (Vivacissimo), com caráter de scherzo, os mesmos materiais reaparecem, novamente transformados. Em pouco tempo ouvimos o tema do trombone (Adagio), desta vez mais longo e funcionando, ele próprio, como transição. A terceira seção (Allegro molto moderato), a mais longa de todas, possui também o caráter de scherzo; trata-se aqui, porém, de um scherzo mais leve e expansivo, recheado de transformações livres dos materiais do início. A terceira aparição do tema do trombone (Adagio) nos leva à quarta e última seção, onde os materiais são livremente reordenados em uma breve reexposição.

 

Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor na Escola de Música da UEMG, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.

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