Suíte Vila Rica

Camargo GUARNIERI

A Suíte Vila Rica foi composta a partir da trilha sonora produzida por Guarnieri em 1957 para o filme Rebelião em Vila Rica. A peça, inicialmente escrita para ilustrar as cenas do filme, foi reelaborada, no ano seguinte, sob formato orquestral e estreada em 1958 pela Orquestra Sinfônica Brasileira, no Rio de Janeiro, sob a regência do autor.

 

A obra desse período de Guarnieri constituiu-se em uma expressão emblemática de aspectos peculiares do “nacional-modernismo” através de configurações rítmicas e melódicas diretamente ligadas à identidade brasileira. É possível reconhecer, na Suíte, elementos inspirados nas modinhas, toadas, cantigas infantis, rodas das violas caipiras e danças de origem africana.

 

Em ambiente sonoro singular, os temas apresentados na Suíte ilustram o contexto dramático do filme inspirado nos ideais da Inconfidência Mineira, transpostos para os anos de 1940 em Ouro Preto, onde estudantes universitários se rebelam em tempos opressivos de ditadura reivindicando a demissão de um tirânico reitor. Os personagens da trama são batizados com nomes de personalidades históricas da Inconfidência, como o poeta Gonzaga, a musa Marília, o herói Xavier e o traidor Silvério.

 

A Suíte é composta de dez curtos movimentos. O movimento de abertura, i, empregado nas cenas finais do filme, abre a Suíte com um tema executado por toda a orquestra em caráter magnificente. Já no segundo movimento, Andantino, sombrio e introspectivo, destaca-se um delicado solo de flauta na seção intermediária. O Andantino ilustra o momento de abertura do filme durante a exibição de belas imagens da cidade ao fundo. O terceiro movimento, Misterioso, enfatiza o momento de conflito da trama, no qual se revela a ação do traidor do enredo. Em contraste, surge o Scherzando, com um breve solo dos instrumentos de sopro em caráter leve e jocoso, ilustrando o reencontro do herói com sua amada. É no Agitato que Guarnieri emprega o tema da canção folclórica mineira Tim, tim oi lá lá. No sexto movimento, Alegre, destaca-se o diálogo entre cordas e sopros em espírito festivo. Esse movimento foi empregado durante a cena em que o poeta socorre sua musa após sofrer uma queda. A musa, em momento posterior, executa ao piano a Valsa, também apresentada no filme em versão orquestral. O Saudoso nos remete às modinhas brasileiras e ilustra o momento em que os alunos são informados do afastamento de um querido professor. Em seguida surge o Humorístico, movimento com caráter vivo e ritmado, ouvido quando os rebeldes se retiram da república onde residiam e passam a morar nas ruas da cidade. A conclusão da Suíte efetiva-se com o Gingado, em ritmo de baião, empregado quando o professor detestado pelos alunos é levado a abdicar da disputa.

 

Este ciclo foi a única obra produzida por Guarnieri com finalidade cinematográfica. A composição foi dedicada ao então Ministro da Educação e Cultura Clóvis Salgado, no período em que Guarnieri atuou como assessor musical junto ao Ministério. Rebelião em Vila Rica foi um dos primeiros filmes coloridos produzidos no Brasil, com roteiro dos mineiros Geraldo e Renato Santos Pereira.

 

César Buscacio
Professor na Universidade Federal de Ouro Preto.

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