Após a Primeira Guerra, o diretor dos Balés Russos, Sergei Diaghilev, propôs a Manuel de Falla uma obra tipicamente espanhola, à altura de suas produções mais famosas – entre elas, A Sagração da Primavera, de Stravinsky, que Falla conhecia de seus anos parisienses. Surge assim a versão definitiva de El sombrero de tres picos [O chapéu de três pontas], balé baseado na farsa popular do escritor Pedro de Alarcón, cujo enredo narra as desventuras de um velho corregedor, o homem do sombrero. Enamorado de Frasquita, bela e inocente moleira, esse juiz frequenta assiduamente o Moinho, lugar de encontro dos moradores da aldeia. O moleiro Lucas Fernandez mostra-se a princípio ciumento; mas, depois, se torna cúmplice da mulher, e o casal inventa peripécias burlescas para ridicularizar o corregedor. Na dança final, os solidários vizinhos agarram o velho galanteador e o jogam, como um boneco, para o alto. A estreia do balé foi em Londres, em julho de 1919, com cenários e figurinos de Picasso, coreografia do russo Massine e direção musical de Ernest Ansermet. Toda a obra respira humor e vitalidade, com citações irônicas de melodias populares e de autores consagrados. A orquestração é, ao mesmo tempo, suntuosa e refinada e, em dois momentos estratégicos, utiliza a voz de contralto com singular propriedade.