Concerto para piano nº 1 em dó menor, op. 35

Dmitri SHOSTAKOVICH

(1933)

Instrumentação: Trompete e cordas.

 

Shostakovich começou a compor precocemente, aos quatorze anos, atraindo a atenção dos principais músicos soviéticos. No Conservatório de Petrogrado, Rússia, foi orientado por renomados mestres do piano e da composição, sendo o curso de seu desenvolvimento criativo determinado pelos acontecimentos em sua pátria.

 

Ao contrário de muitos compositores soviéticos de sua geração, Shostakovich não se exilou, optando corajosamente por conciliar as revoluções musicais de sua época com as restrições impostas pelo regime stalinista. Utilizou elementos da música contemporânea ocidental para impingir certo caráter grotesco e exaltado às suas sátiras operísticas (O Nariz, de 1928, baseado em Gogol) e, da mesma forma, expressar ironia mordaz em obras para o balé (A Idade de Ouro, de 1930) e para o cinema (A Nova Babilônia, de 1929). Seu temperamento audacioso logo o pôs em conflito com as autoridades soviéticas, que o acusaram de vulgaridade, controlando suas obras até a morte de Stálin, ocorrida em 1953.

 

Após o sucesso da Primeira Sinfonia, estreada na sua formatura, em 1926, o jovem compositor demonstrou ser hábil em quase todos os gêneros musicais. A primeira incursão no gênero concertante foi o Concerto para piano nº 1, op. 35, de 1933 – na verdade, um concerto para piano, trompete obbligato e orquestra de cordas. Shostakovich concebeu a obra, inicialmente, para trompete solista e orquestra. Posteriormente, adicionou o piano e relegou o trompete a um papel secundário, ora respondendo, ora comentando os temas do piano e da orquestra. O Concerto para piano nº 1 possui colagens, citações e paródias musicais de canções populares alemãs e inglesas, de obras de Beethoven, de Haydn e do próprio Shostakovich, e mesmo potenciais elementos circenses e jazzísticos, os quais viriam a se consolidar na Suíte para Orquestra de Jazz nº 1, escrita no ano seguinte. A orquestração do Concerto, à maneira de um concertino neobarroco (em voga nos anos 1930 em toda a Europa), assim como o maneirismo neoclássico, herdado da escola vienense, unem-se às polcas e valsas, reambientadas pelo espírito de Shostakovich.

 

O Concerto para piano nº 1 foi estreado a 15 de outubro 1933, na abertura da temporada de concertos da Orquestra Filarmônica de Leningrado, sob a regência de Fritz Stiedri, com Shostakovich ao piano e Alexander Schmidt ao trompete. Os movimentos, interligados, possuem a indicação attacca, significando que não deve haver interrupção entre eles. O espirituoso Allegretto reúne diversos temas numa coesão surpreendente. O segundo movimento, uma valsa lenta, íntima e sincera, remete ao Adagio do Concerto de Ravel e contrasta emocionalmente com os demais movimentos. O Moderato seguinte, iniciado por solo de piano, introduz o burlesco e fanfarrão Allegro con brio. A obra de Shostakovich, com uma veia de jovialidade iconoclasta, alia construção contrapontística à exibição veemente do pianismo moderno russo. O compositor, sagaz e irônico, coloca o humor e a música a serviço da crítica social.

 

Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.

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