Zoltán Kodály
Instrumentação: piccolo, 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, fagote, contrafagote, 4 trompas, 2 trompetes, tímpanos, percussão, cordas.
Uma das respostas às várias correntes estéticas que vigoraram na música europeia no princípio do século XX foi o nacionalismo. Na verdade, diferentemente de outras propostas de reestruturação da linguagem musical, como as vanguardas neoclássica e dodecafônica, o nacionalismo se estabelecera como movimento musical já no início do século XIX. O extenso e modelar trabalho etnomusicográfico de Zoltán Kodály, realizado em diferentes regiões de seu país de origem e em países vizinhos, inspirou novas composições nacionalistas e promoveu o uso das canções folclóricas como material fundamental no processo da aprendizagem musical nas escolas. Kodály defendia o desenvolvimento da consciência nacional húngara, desmantelada pelas sucessivas dominações otomanas, ciganas e austríacas, e, por meio de uma estreita colaboração com o compatriota Béla Bartók, catalogou milhares de melodias folclóricas húngaras organizadas sob o título Corpus Musicae Popularis Hungaricae.
Enquanto Bartók foi um universalista, tomando as canções populares como um trampolim para uma música completamente nova e pessoal, Kodály seguiu os passos convencionais do nacionalismo. No caso da Hungria, a questão nacional era delicada: Franz Liszt privilegiara em suas Rapsódias Húngaras a música dos ciganos húngaros e a dos nobres – o que não é um equívoco, mas uma restrição. A música genuinamente folclórica da Hungria estava na zona rural – no canto de camponeses e em grupos étnicos distintos. O principal grupo étnico húngaro são os Székelys, embora tenham migrado também para a Ucrânia e a Romênia. Atualmente, por serem historicamente isolados, os Székelys são considerados húngaros por excelência.
O distrito de Marosszek, cujas tradições inspiraram Kodály a conceber em 1923 um conjunto de danças para piano, não existe mais. O nome deriva de um grupo de Székelys que vivia entre os rios Szamos e Maros. As Danças de Marosszek para piano foram completadas em 1927 e, três anos depois, tiveram a orquestração comissionada pelo maestro Arturo Toscanini, que estreou a nova versão em 1930 à frente da Filarmônica de Nova York. Na partitura impressa, Kodály explica a origem das danças: “Talvez não seja por acaso que a maior parte da velha música folclórica foi preservada no distrito de Marosszek, na Transilvânia. (…) Até a [1ª Grande] Guerra podiam-se ouvir essas danças em cada aldeia, sendo tocadas por um violino ou uma flauta, e os idosos costumavam cantá-las. (…) As famosas Danças Húngaras de Brahms são uma expressão da Hungria urbana na década de 1860. (…) Minhas Danças de Marosszek têm suas raízes em um passado muito mais remoto”.
As Danças de Marosszek se abrem com um tema marcante – Maestoso e poco rubato – reapresentado três vezes, entremeado por solos instrumentais ora saltitantes ora em lamentosos improvisos. A métrica dos momentos meditativos baseia-se na pronúncia do húngaro e dão um colorido exótico à obra, que se encerra festivamente, à ardente maneira húngara.
Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.