Johann Nepomuk HUMMEL
Hummel, de origem eslovaca, filho de músico eminente, foi criança prodígio. Seu pai levou-o desde cedo para turnês europeias em que o menino impressionava por um precoce virtuosismo ao piano. Teve contato com todos os grandes músicos da época, os quais sempre tiveram grande prazer em lhe dar orientação. Em Viena, para onde foi quando o pai se transferiu para essa cidade, Mozart o ouviu e literalmente levou-o para casa e lhe deu aulas em 1787-1788. Em uma das turnês, Hummel encontrou-se com Muzio Clementi em Londres e nessa cidade permaneceu quatro anos, estudando com o mestre italiano. Mais tarde, em Viena, foi aluno de Albrechtsberger, de Haydn (para quem Hummel também tocara em Londres) e de Antonio Salieri. Beethoven (1770-1827) também recebera ensinamentos de Haydn, Salieri e Albrechtsberger. Viena era o centro da música europeia, e Hummel conviveu ali – além desses mestres, com Franz Schubert (1797-1828) e com outros compositores que eram grandes pianistas, como Chopin, Liszt, Czerny (que fora aluno de Beethoven e com quem Chopin tocou a quatro mãos), Mendelssohn, Hiller e tantos outros.
Chopin já tivera contato com Hummel em Varsóvia e observara com interesse as características da técnica do pianista alemão, uma celebridade. Por sua vez, Hummel se impressionou com Chopin, com quem voltou a encontrar-se em Viena quando este esteve instalado nessa cidade (fim de 1830-1831). A maneira de tocar de Chopin encantava os vienenses pelo cantabile, pela suavidade e personalidade, mas diferia muito dos pianistas locais, que tinham uma técnica mais brilhante e mais seca. Hummel exerceu forte influência na técnica pianística do século XIX, fato que pode ser verificado, até certo ponto, com a linhagem Hummel, Czerny, Liszt. Sua atuação junto aos fabricantes de pianos, em Paris e em Viena, foi igualmente marcante, com propostas de aprimoramento da mecânica do instrumento.
Hummel era um músico completo, no sentido da abrangência de seus interesses, e, após ocupar durante sete anos o cargo de Kapellmeister – que tinha sido de Haydn – junto aos Esterházy, em Eisenstadt, exerceu também essas funções em Stuttgart e em Weimar (onde se relacionou com Goethe). Escreveu preferentemente para o seu instrumento – concertos, sonatas, música de câmara com piano. Mas compôs também para instrumentos de sopro, missa, balés e óperas. Não foi um músico que se dedicasse a divulgar apenas as suas obras. As sinfonias de Beethoven, por exemplo, através de suas transcrições para piano a quatro mãos, tornaram-se familiares a um número enorme de músicos amadores. O Concerto para trompete continua a ser estimado e executado, e é uma das raras obras do autor com constantes gravações comerciais.
Essa obra evidencia o processo de transição vivido por Hummel, do Classicismo ao Romantismo. Podemos perceber inicialmente o rigor da forma sonata clássica, após uma introdução marcial, trazendo a bela e impressionante entrada do trompete. A influência sensível da ópera romântica aparece nos dois primeiros movimentos e no cantabile, à Bellini, especialmente nas linhas melódicas. E o rondó final surge do andante, sem interrupção, solto, exuberante e virtuosístico.
Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, Professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado: Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.