Suíte nº 4 em Sol maior, op. 61, “Mozartiana”

Piotr Ilitch TCHAIKOVSKY

(1887)

“A beleza da melodia de Mozart é um mistério”, dizia Tchaikovsky. Essa música ele já ouvia na infância, quando, em um pequeno órgão mecânico, o pai o fazia ouvir obras de Mozart, Bellini, Rossini e Donizetti. Muito sensível, extremamente emotivo, “era um menino de vidro,” na opinião de sua preceptora.

Fato comum no século XIX, Piotr entra na Escola Preparatória de Direito de São Petersburgo aos dez anos. O diretor, príncipe melômano, convidava artistas para dar recitais – até mesmo Clara Schumann se apresentou ali. Tchaikovsky, que estudava piano com um professor alemão, passava horas tocando e improvisando para os colegas. Era apreciado por todos pela delicadeza, brandura e encanto pessoal. “Tudo nele era bom, inteligente e nobre”, escreveu seu irmão Modest. Terminada a Escola de Direito (nove anos ao todo), conseguiu trabalho no Ministério da Justiça.

Em 1862, o pianista Anton Rubinstein (sem parentesco com Arthur Rubinstein) cria o Conservatório de São Petersburgo, primeira escola de música da Rússia. Tchaikovsky frequenta ali aulas de composição e, em 1863, já é instrutor nessa instituição. Não teve preocupações com seu sustento, graças às doações financeiras de Nadezhda Meck, grande apreciadora de sua música, com quem manteve correspondência e uma relação artística de alto nível, mas sob a condição, imposta por ela, de não se conhecerem pessoalmente.

A Suíte “Mozartiana”, escrita em 1887, é um tributo a Mozart, em comemoração aos cem anos de Don Giovanni (ópera de Mozart estreada em Praga em 1787). “Adoro a música dessa ópera que, neste minuto, enquanto escrevo, me faz chorar de comoção”. A Suíte é uma orquestração, feita por Tchaikovsky, de quatro peças, independentes entre si, compostas por Mozart: Giga, Minueto, Variações sobre um tema de Gluck e Ave Verum. As três primeiras foram orquestradas por Tchaikovsky a partir do original de Mozart para piano. A Giga, um fugato de curta duração, possui um ritmo constante, com respiração a cada três notas. Tecnicamente brilhantes, as Variações sobre um tema de Gluck foram compostas por Mozart para suas apresentações em Viena. A flauta faz o solo na Variação III, o vibrafone é usado na Variação VIII, tímpanos e pratos dão à Variação X a densidade de obra sinfônica. Quanto ao Ave Verum, Mozart o compôs no ano de sua morte para coro, cordas e órgão contínuo, mas Tchaikovsky elaborou a orquestração a partir de sua transcrição pianística feita por Franz Liszt. Em um concerto de obras suas, em 1887, em Moscou, a Suíte foi estreada pelo autor, “com brilhante sucesso”, diz o jornal do dia seguinte.

Certa vez Tchaikovsky escreveu: “Já senti desejo da morte. Mas depois passou, e de novo surgiu a sede de viver para terminar a minha obra, de dizer tudo o que ainda não foi dito”. No Testamento de Heiligenstadt (1802) escreve Beethoven: “Que humilhação não ouvir uma flauta de longe! Mais uma experiência como essa e eu teria posto fim à minha vida. Foi minha Arte, e somente ela, quem me reteve. Parecia-me impossível deixar o mundo antes de exteriorizar tudo o que está dentro de mim”. Entre os dois músicos, uma afinidade de sentimentos comovente.

Norah Almeida
Pianista, professora formada pelo Conservatório de Música de Genebra.

Olho:
A Suíte é uma orquestração, feita por Tchaikovsky, de quatro peças, independentes entre si, compostas por Mozart: Giga, Minueto, Variações sobre um tema de Gluck e Ave Verum.

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