Tintagel

Arnold BAX

(1917/1919)

Instrumentação: piccolo, 3 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, contrafagote, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, cordas.

 

Arnold Bax, nascido em uma abastada família inglesa, nunca frequentou escola regular e tampouco precisou trabalhar; pôde assim dedicar-se à leitura e à música. Lia sistematicamente óperas de Wagner ao piano – possuía enorme habilidade para a leitura de partes orquestrais à primeira vista, o que lhe proporcionou premiações na Royal Academy of Music, instituição na qual ingressou em 1900 e formou-se em 1905. Dedicou-se também a escrever literatura e, sob o pseudônimo de Dermot O’Byrne, publicou poemas, pequenas histórias e três de suas quatro peças teatrais.

 

Em 1902 Bax descobre o livro The Wanderings of Oisin and Other Poems de W. B. Yeats, figura de destaque do Celtic Revival, movimento irlandês de retomada e promoção da cultura celta. Deslumbrado por Yeats, viaja constantemente para a Irlanda, onde encontra refúgio e inspiração. Inspiram-no, também, as viagens para a Noruega, Rússia e Ucrânia, entre os anos de 1905 e 1912. Sua linguagem reúne, às melodias e coloridos celtas e nórdicos, o romantismo de Liszt e Wagner e um impressionismo próprio, de texturas flutuantes bastante diferentes daquelas de Debussy.

 

Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, Bax isolou-se em seu trabalho de composição. À época vivia também um conflito emocional: manter seu casamento com Elsita Sobrino ou entregar-se a sua paixão por Harriet Cohen, eminente pianista que conhecera em 1912. No verão de 1917, entre agosto e setembro, Bax decide viajar com Harriet por seis semanas para Tintagel, costa norte de Cornwall. A guerra, o drama pessoal e a imagem das ruínas do castelo de Tintagel no alto da colina, invadindo o Atlântico, serviram de pretexto para a composição daquela que se tornaria sua obra mais popular, o poema sinfônico Tintagel, finalizado em outubro de 1917, logo após seu retorno a Londres.

 

Desde 1905 Bax dedicava especial atenção à composição de poemas sinfônicos, com predileção por temas marítimos, como seu favorito The Garden of Fand, de 1916. Apesar do impetuoso processo de composição, Tintagel só seria devidamente orquestrado e finalizado em janeiro de 1919. Sobre a obra, Bax declara: “Embora sem detalhar um programa específico, esta obra pretende evocar uma imagem tonal da falésia de Tintagel coroada por um castelo; e particularmente da grandeza do Atlântico, visto das falésias de Cornwall num ensolarado – embora por isso não menos ventoso – dia de verão. Na seção intermediária da peça imagina-se que o crescente tumulto do mar faz emergir à memória as históricas e lendárias referências do lugar, especialmente as do Rei Arthur, do Rei Mark e de Tristão e Isolda.” Estreado em Winter Gardens, pela Bournemouth Municipal Orchestra regida por Dan Godfrey, em 20 de outubro de 1921, Tintagel não é mera pintura, ou um conjunto de impressões subjetivas, mas uma busca pela essência da paisagem e da história de Cornwall, mesclada com o incômodo da guerra e com o desconforto social provocado pelo seu relacionamento com Harriet Cohen, a quem a obra é dedicada.

 

Igor Reyner
Pianista, Mestre em Música pela UFMG, doutorando de Francês no King’s College London e colaborador do ARIAS/Sorbonne Nouvelle Paris 3.

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