A verdadeira fruição musical dos "Noturnos" de Chopin
| 21 jul 2020
A genialidade de Mendelssohn na Italiana
Felix MENDELSSOHN | Sinfonia nº 4 em Lá maior, “Italiana”
O prodígio associado a Mozart é sempre utilizado ao se ilustrar a genialidade ligada ao grande símbolo da “criança-prodígio”. Começou a tocar piano e violino aos 3 para 4 anos. Aos 5 já compunha. Aos 8 excursionava pelas grandes capitais da Europa, revelando a reis e imperadores seu talento excepcional como pianista. Aos 12, compôs sua primeira ópera etc.
Na sombra desse gigante da história da música que é Mozart, a figura de Felix Mendelssohn ficou um tanto escondida e injustamente negligenciada. É certo que Mendelssohn não começou a compor tão cedo quanto Mozart. Suas primeiras obras foram escritas quando tinha 12 anos (pelo menos as que sobreviveram). Embora seu talento enquanto pianista fosse considerável, ele não teve o mesmo nível de exposição que o compositor austríaco obteve. Mas certas características da criatividade e talentos naturais de Mendelssohn, comparados lado a lado com os de Mozart, impressionam.
Com o devido grau que a situação requer, ao compararmos, por exemplo, obras escritas por Mendelssohn aos 12, 13 anos, com aquelas de Mozart na mesma idade (mesmo resguardando questões estéticas que algumas décadas de diferença entre eles mostram), é reveladora a mestria que Mendelssohn tinha de certas questões técnicas, como o domínio das regras contrapontísticas, harmônicas e estruturais. É lógico que isso não faz a menor diferença quando falamos de dois dos grandes gênios da música universal. Mas devemos dar valor a quem tem valor, e sempre achei que Mendelssohn merecesse maior reverência do que lhe foi dada.
Outro aspecto impressionante que distingue Mendelssohn de outros prodígios é o fato de que não só em música ele se manifestava. Contrariamente à grande maioria dos compositores ao longo da história, seus pais tinham confortáveis recursos financeiros, e Mendelssohn soube aproveitar essa condição para expandir ainda mais seus talentos.
Pelas suas cartas, escritas por um adolescente em viagens pela Europa, vemos uma lucidez e uma perfeição de escrita invejáveis. Além disso, já que na época não havia iPhones ou máquinas fotográficas, Mendelssohn desenhava as cenas que havia descoberto e que mais o atraíam.
Vejam, por exemplo, seus desenhos mostrando a Ponte dos Suspiros, em Veneza:
ou da Costa Amalfitana:
Foi exatamente nessas viagens pela Itália que Mendelssohn concebeu sua Quarta Sinfonia, obra de grande vivacidade, brilho, alegria, mostrando suas mais profundas impressões e sentimentos diante do panorama a ele revelado por aquele país. A exuberância rítmica, o caráter dançante da tarantela do primeiro movimento ou o saltarelo do último, o lirismo nostálgico da melodia do segundo movimento, tal qual uma canção ou ária de ópera, tão enraizados na “genética” do povo italiano, tudo isso é clara e magistralmente apresentado nesta importante sinfonia.
Não tanto pela interpretação ou pela qualidade sonora aqui apresentada, mas por uma curiosidade essencialmente histórica, estou recomendando esta performance da Orquestra do Gewandhaus de Leipzig, regida por Kurt Masur. Foi com essa orquestra, em 1833, aos 24 anos de idade, que Mendelssohn estreou esta sinfonia! Uma das mais tradicionais e longevas orquestras em todo o mundo, a Gewandhaus foi responsável por várias estreias históricas não só de obras de Mendelssohn (da qual foi seu Diretor Musical), mas muitos outros compositores que o seguiram.
Que bom haver em alguns lugares do mundo a possibilidade de continuidade de trabalhos que constroem uma história local e que, eventualmente, se transformam em acervo universal…
A imagem que ilustra este post é uma aquarela de James Warren Childe, 1839.
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