Concerto para piano nº 1 em Dó maior, op. 15

Ludwig van BEETHOVEN

“O firme vigor da frase inicial, emitida pela orquestra, sugere aquela confiança em si próprio que sempre tem sido considerada como a marca e a recompensa do gênio enquanto jovem. Tudo o que compõe é franco, direto, livre de ideias opressoras”, afirmou o crítico musical Ralph Hill a respeito da introdução do Concerto para piano nº 1 de Beethoven. Primeiro a ser publicado, em 1801, este concerto foi na verdade o terceiro composto, e seus esboços remontam a seis anos antes (a primeira incursão no gênero fora aos 14 anos de idade, com o inacabado Concerto para piano em mi bemol, que não integrou a lista oficialmente reconhecida por Beethoven. Em 1788 o compositor iniciou o Concerto em si bemol, publicado como nº 2, no qual remanesce a estilística clássica).

 

O Concerto em Dó maior, composto em 1795, é dotado de um pianismo brilhante, de uma orquestração cheia de nuances heroicas e efeitos de dinâmica, tendo sido escolhido pelo compositor para seu début em Viena. Beethoven foi um pianista extraordinário e um grande improvisador, antes de se tornar conhecido como autor de sinfonias. Escreveu, para este concerto, nada menos que três diferentes solos de piano de natureza improvisatória, chamados cadenzas, nos quais ostenta toda a sua virtuosidade. Não obstante, pedira em carta aos editores do Allgemeine Musicalische Zeitung (periódico vienense) que as críticas fossem benevolentes com essa obra que já pertencia ao seu passado. Mozartiano em sua estrutura formal, este concerto está, porém, mais próximo de Haydn no conteúdo e na expressão. Ao utilizar um scherzo para encerrá-lo, Beethoven afasta-se do rondo-minueto comum ao estilo galante de Mozart e se aproxima do humorismo exuberante de Haydn, seu então professor em Viena.

 

Na terceira das Sonatas op. 2 (em Dó maior), dedicadas a Haydn, Beethoven escolhera, para o movimento lento, o distante tom de Mi maior; já no Concerto nº 1, escrito na mesma tonalidade, Dó maior, ele optou pelo equidistante tom de lá bemol. Essa inovação sobre o padrão clássico permite uma grande amplitude tonal e harmônica entre os movimentos, cuja inter-relação constituirá um elemento importante em toda a futura produção beethoveniana. Para realizar uma boa transição entre as distintas tonalidades, o compositor encerra o Allegro inicial sobre a tônica não harmonizada, ou seja, sobre a nota Dó executada por toda a orquestra, e inicia o movimento seguinte com a mesma nota, Dó, numa doce melodia apresentada em solo de piano. Acredita-se que a doçura e o encantador lirismo do Largo estejam relacionados à figura da princesa Odescalchi, nascida condessa Babette von Kéglévich, que Beethoven tinha em grande estima. Era sua aluna de piano e sua vizinha em Viena e, segundo Karl, sobrinho de Beethoven, “ele vinha dar-lhe aulas de roupão e chinelos”. O compositor dedicou-lhe também a Sonata nº 4, op. 7, apelidada “Amorosa” pelos vienenses. No rondó final transparece a afinidade com a alegre música popular vienense da época. Para nós, brasileiros, é difícil deixar de notar alguma curiosa semelhança entre o contorno melódico do Tico-Tico no Fubá de Zequinha de Abreu e um dos temas centrais do último movimento.

 

Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.

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