Claudio Santoro
O talento musical de Claudio Santoro foi descoberto através do violino que ganhara do tio aos dez anos. Em três anos obteve tão impressionante progresso que, com bolsa de estudos do governo amazonense, foi enviado para se aperfeiçoar no Conservatório de Música Rio de Janeiro. Lá, aos 18 anos, foi designado professor ao concluir o curso. Em 1940, dedicou-se à composição e aproximou-se de seu primeiro mestre, Hans-Joachim Koellreutter, com o qual estudou até meados de 1941. Não foi Koellreutter o iniciador da inquietude estética de Santoro, mas, certamente, o mestre ajudou-o a fortalecer sua crença no método dodecafônico e no mote “não há arte sem ideologia”. Na década de 1950, Santoro iniciou uma nova fase composicional como fruto dos estudos com Nadia Boulanger em Paris. Suas ideias musicais subitamente tornaram-se líricas, subjetivas e leves, no sentido da assimilação popular. Tal transformação foi também a resposta musical de um ativista comunista à censura dos governos Dutra e Vargas. Para ele, os termos popular e nacionalista transcendiam o Brasil e iam direto à Rússia.
Dedicou-se a compor sob os preceitos do Realismo Soviético e a transpô-los para seu país: “a forma e o conteúdo da música devem expressar o entusiasmo do nosso povo, suas lutas, suas esperanças”. Em 1952 conquistou em Viena o Prêmio Internacional da Paz pela obra orquestral Canto de Amor e Paz. Em 1953, compôs a Sinfonia da Paz, da qual foi retirada a palavra “paz” pelos órgãos de censura, que permitiam somente o título Sinfonia nº 4. Na década de 1960, Santoro retornou ao dodecafonismo e ousou ao criar experimentos eletroacústico visuais. Faleceu em Brasília em 1989, em pleno palco, regendo um ensaio da Orquestra do Teatro Nacional de Brasília, da qual foi fundador e maestro titular. Em sua homenagem, a partir daquele ano a casa passou a se chamar Teatro Nacional Claudio Santoro.
Escreveu 28 obras para orquestra e instrumento solista, e provavelmente teve a intenção de compor mais de um concerto para violoncelo. Seu único Concerto para violoncelo foi composto em Berlim, Alemanha, em outubro de 1961, após um período de intensa atividade na Europa, como regente. As relações de Santoro com a Alemanha foram tão profícuas que ele posteriormente residiu por quase uma década naquele país. Não é possível fazer referências aoConcerto para violoncelo sem citar a figura do violoncelista brasileiro Aldo Parisot, que estreou a obra em 1965, regendo a Orquestra Sinfônica de Buffalo no 3º Festival Internacional de Música de Washington, nos Estados Unidos. Reverenciado instrumentista e professor, Parisot vive hoje seu nonagésimo ano, quase como uma lenda, e faz parte do corpo docente da prestigiosa Yale School of Music. Entre os compositores que conheceu e lhe dedicaram obras estão também Camargo Guarnieri, José Siqueira e Villa-Lobos. Parisot e Santoro, além de músicos, dedicaram-se à pintura, e vale a pena lembrar que seus nomes encabeçaram a lista dos Manifestos do Grupo Música Viva, movidos por Koellreutter na década de 1940:
A revolução espiritual que o mundo atualmente atravessa não deixará de influenciar a produção contemporânea. Essa transformação radical que se faz notar também nos meios sonoros é a causa da incompreensão momentânea frente à música nova. As ideias, porém, são mais fortes do que preconceitos!
De fato, tal declaração, escrita há quase setenta anos, continua audaciosamente viva.
Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.