Franz Joseph HAYDN
Instrumentação: 2 oboés, 2 trompas, cordas.
Homem simples, de origem camponesa, filho de um carpinteiro, Haydn serviu por quarenta anos como músico da poderosa família Esterházy, combinando as funções de regente e compositor. O ritmo de trabalho era alucinante, envolvendo música de câmara, concertos sinfônicos, óperas, música religiosa ou para o teatro. Felizmente, Haydn dispunha de uma excelente orquestra, permanentemente disponível para a imediata execução de suas obras, privilégio que ele soube aproveitar com sabedoria. Mais tarde, em uma carta ao biógrafo August Griesinger, o compositor relembraria os longos anos passados em Esterháza: “eu podia melhorar, acrescentar, cortar, ousar. Estava isolado do mundo e tive que me tornar original”. Optando pelo experimentalismo, Haydn desenvolveu uma linguagem musical própria, detalhista, intelectual e espirituosa. Sua obra foi decisiva para a fixação e a plena maturidade dos vários gêneros ligados à forma sonata clássica (sobretudo a Sinfonia e o Quarteto de Cordas).
Entre as músicas sinfônicas exigidas de um compositor de corte, os concertos para instrumentos solistas possuíam características fundamentalmente diferenciais. Eram compostos para ocasiões e solistas específicos, devendo considerar os recursos individuais do instrumentista e o gosto particular de quem fizera a encomenda. Haydn (ao contrário de Mozart) não era um instrumentista virtuose, e os concertos de piano escritos para seu uso próprio excluem a virtuosidade inerente ao gênero. Mas, na corte de Esterházy havia brilhantes solistas, como o violinista Luigi Tomasini, o trompetista Anton Weidinger, os violoncelistas Anton Kraft e Joseph Weigl. Para eles, o compositor escreveu vários concertos, cuja maioria se perdeu. Algumas dessas partituras, pelo caráter utilitário e imediatista de sua gênese, permaneceram apenas esboçadas; outras foram destruídas no incêndio da Casa de Ópera de Esterháza (1779) e muitas se extraviaram. Alguns manuscritos só recentemente foram descobertos, como é o caso do Concerto para violoncelo em Dó maior, cujo tema principal do primeiro movimento fora anotado pelo próprio Haydn no catálogo de suas obras, datado de 1765. A partitura foi reconstituída a partir das partes orquestrais encontradas por um zeloso bibliotecário de Praga, em 1961. Desde então, por suas inegáveis qualidades, o Concerto se impôs imediatamente ao repertório. O Moderato inicial corresponde à forma sonata clássica (exposição, desenvolvimento e reexposição). Constrói-se sobre um primeiro tema – facilmente memorizável pelos seus ritmos pontuados – e um maravilhoso segundo tema contrastante. Apesar do classicismo formal, o movimento mantém-se impregnado de espírito barroco pela alternância dos solos com os tutti orquestrais. O Adagio seguinte, um dos mais eloquentes de Haydn, possui caráter mais clássico e muito cantante. O Allegro molto final possui um ímpeto irresistível, exigindo que o solista e a orquestra se projetem em um turbilhão contínuo de extraordinária virtuosidade.
Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado.