Heitor VILLA-LOBOS
Instrumentação: piccolo, 2 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, contrafagote, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, piano, celesta, cordas.
Heitor Villa-Lobos é, sem dúvida, o capítulo mais importante da história da música brasileira. Sua obra, principalmente para orquestra, possui uma multiplicidade de vozes, um tecido contrapontístico denso, como os sons de uma floresta tropical: “a grande arte é a própria Natureza”, dizia. Ser nascido brasileiro justificaria sua vasta produção: “minha obra musical é consequência da predestinação. E se ela é em grande quantidade, é fruto de uma terra extensa, generosa e quente”. Além dos elementos da natureza, ele soube captar toda a gama de influências folclóricas e populares de nossa cultura e aplicá-las em sua música.
Em 1945, terminado o conjunto das nove Bachianas Brasileiras, Villa-Lobos direcionou sua produção composicional ao gênero sinfônico e concertante, recebendo encomendas de músicos, regentes e orquestras de todo o mundo. A partir de 1949, atuou como maestro na Europa e América, ampliando a divulgação de sua música: “pretendo levar na bagagem, em minha visita aos Estados Unidos, uma alma diferente, cheia de emoções imprevistas, mas que vibrará com o espírito continental dos homens do Norte.” Na década de 1950, por encomenda da orquestra norte-americana de Louisville, compôs Erosão e Alvorada na floresta tropical, estreadas pelo maestro fundador da orquestra, Robert Whitney. Villa-Lobos mostrou-se particularmente atraído por temas ameríndios: Erosão (1950) é baseada em lenda sobre a origem do rio Amazonas; Rudá, Deus do Amor (1951) conta a história das Américas pré-colombianas e a Sinfonia nº 10, Ameríndia (1952) é um oratório sobre versos do Padre José de Anchieta. Villa-Lobos abordou o tema pela última vez um ano antes de sua morte com a trilha sonora para o filme Green Mansions (1958), no qual a atriz Audrey Hepburn, jovem e maltrapilha, interpreta uma menina da selva. A trilha, da qual faz parte a famosa Melodia Sentimental, foi batizada Floresta do Amazonas.
Para compor Alvorada na floresta tropical, Villa-Lobos inspirou-se em lendas indígenas que dizia terem sido recolhidas na Amazônia: “as florestas, rios, as cascatas, os pássaros, os peixes e bichos ferozes, os silvícolas, os caboclos e as lendas marajoaras, tudo influi psicologicamente na confecção dessa obra. Seus principais motivos melódicos representam o tema da invocação, o da surpresa da miragem, o rastejar e galope dos monstros lendários do Amazonas, o da sedução, da volúpia, da sensualidade da índia sacerdotisa, o canto heroico dos guerreiros indígenas e o do precipício”.
A imagem dos primeiros feixes de sol infiltrando-se gradualmente na mata, afugentando as criaturas noturnas e a escuridão sob o dossel da floresta, inspirara Villa-Lobos, ainda jovem, a escrever Tédio da Alvorada (1917), abertura transformada no bailado Uirapuru. Entre os apreciadores do amanhecer na floresta estão Carlos Gomes, autor de Alvorada (1889), interlúdio orquestral da ópera Lo Schiavo, e Vinicius de Moraes e Tom Jobim, compositores da Sinfonia da Alvorada (1958), encomendada por Juscelino Kubitschek.
Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.