Sinfonia nº 5 em dó menor, op. 67

Ludwig van BEETHOVEN

(1805/1808)

 

Embora os primeiros esboços da Quinta Sinfonia datem do início de 1804, Beethoven trabalhou assiduamente na obra apenas em 1807 e terminou a composição no início de 1808. A Quinta Sinfonia foi executada, pela primeira vez, no dia 22 de dezembro de 1808, no Theater an der Wien, por um grupo de músicos angariados para o concerto, sob a regência do próprio Beethoven. Um ouvinte de hoje transportado para a Viena da época se assustaria com a precariedade dos concertos. Viena não tinha orquestras permanentes nem salas de concerto. Os concertos eram realizados nos palácios dos príncipes ou nos teatros, geralmente com acústica precária. Os músicos eram contratados para ocasiões específicas e geralmente executavam as obras com pouquíssimos ensaios, já que os cachês eram, na maioria das vezes, insuficientes para um trabalho artístico detalhado.

 

Um típico concerto do início do século XIX consistia de uma abertura, um concerto, uma sinfonia, árias e cenas de ópera e uma improvisação do solista. O concerto que Beethoven deu naquele dia, além de muito longo, mesmo para os padrões da época, foi longe de ser perfeito. Nele foram estreadas a Quinta e a Sexta Sinfonias, e a Fantasia Coral; o Concerto para piano nº 4 foi executado em público pela primeira vez; quanto à ária de concerto Ah! Perfido e vários movimentos da Missa em Dó maior tiveram naquela oportunidade sua primeira execução em Viena; e Beethoven ainda sentou-se ao piano para uma série de improvisações. Embora o público estivesse acostumado a concertos longos, o concerto de estreia da Quinta Sinfonia durou intermináveis quatro horas, em um teatro com sistema de aquecimento estragado. Beethoven havia requisitado o teatro durante todo o ano e lhe deram apenas uma noite morta, três dias antes do Natal. Foi uma noite longa de inverno para o público vienense, que assistiu a um concerto das 18h30 às 22h30 com obras modernas de um compositor pouco conhecido, executadas por uma orquestra que não havia ensaiado suficientemente. O compositor Johann Reichardt, que estava presente, escreveu:

“O pobre Beethoven, que finalmente realizava seu próprio concerto e conseguia seu primeiro e único pequeno lucro de todo o ano, recebeu, nos ensaios e na apresentação, apenas oposição e praticamente nenhum suporte. Os cantores e a orquestra, compostos dos elementos mais heterogêneos, não conseguiram realizar um único ensaio completo das peças apresentadas.”

 

A Quinta Sinfonia foi dedicada ao príncipe Lobkowitz e ao conde Razumovsky. Extremamente moderna para a época e de difícil assimilação pelo público, ela passou por um longo calvário no século XIX até se tornar, a partir da segunda metade do século XX, a obra sinfônica mais conhecida em todo o mundo. O Allegro con brio, extremamente vigoroso, inicia-se com uma breve introdução, onde ouvimos, pela primeira vez, o tão famoso motivo de quatro notas. O primeiro tema, nas cordas, é elaborado a partir desse motivo, que será ouvido por toda a obra (no primeiro movimento ele será repetido mais de duzentas vezes). As trompas anunciam o segundo tema, de caráter doce, que será apresentado pelos primeiros violinos e repetido no clarinete e flauta. Após um desenvolvimento motívico e a reapresentação dos dois temas, uma longa coda finaliza o movimento.

 

O Andante con moto é uma variação dupla, ou seja, dois temas variados alternadamente. O primeiro, lírico, surge logo no início, nas violas e violoncelos. O segundo, marcial, é apresentado em seguida, pelos clarinetes, fagotes, primeiros e segundos violinos. Após uma série de variações surge o terceiro e curto tema, nas madeiras, baseado no motivo inicial do primeiro tema. Uma reapresentação do primeiro tema nos conduz à coda.

 

O terceiro movimento (Allegro) é um Scherzo. A primeira seção inicia-se com o primeiro tema, em pianissimo, nos violoncelos e contrabaixos. O segundo, enérgico, apresentado primeiramente nas trompas, em fortissimo, é derivado do motivo de quatro notas que inicia a sinfonia. A seção central (Trio) possui apenas um tema, inicialmente apresentado nos violoncelos e contrabaixos, e imitado por toda a orquestra. Quando a primeira seção (Scherzo) é reapresentada, os temas são executados delicadamente nas cordas em pizzicato, com algumas intervenções das madeiras. Uma transição nos conduz, sem interrupção, ao movimento seguinte. Beethoven percebeu que uma sinfonia como essa precisava de um Finale grandioso: assim, no último movimento (Allegro) ele acrescenta um flautim, um contrafagote e três trombones à orquestra. Embora comuns na segunda metade do século XIX, a presença desses instrumentos em uma sinfonia era, à época, uma surpresa. O primeiro tema, majestoso, abre o movimento, executado por toda a orquestra. O segundo tema, lírico, porém ainda vigoroso, é apresentado pelas cordas e madeiras. Na seção central Beethoven trabalha, principalmente, motivos do segundo tema. Ao final desta seção surge, inesperadamente, o segundo tema do Scherzo, delicadamente apresentado nas cordas em pizzicato e nas madeiras. Um crescendo nos leva à reapresentação da primeira seção e uma coda grandiosa encerra a sinfonia.

 

Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais e Fundação de Educação Artística, autor dos livros Música menor e Os sapatos floridos não voam.

anterior próximo