Concerto para piano nº 1

Bela BARTÓK

(1926)

Instrumentação: Piccolo, 2 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, 3 trombones, tímpanos, percussão, cordas.

 

Grande pianista, Béla Bartók atuou sob a direção de célebres regentes, convidado por orquestras europeias e americanas. Fez seu primeiro recital aos dez anos, quando ainda estudava com sua mãe, competente professora de piano. Depois, aperfeiçoou-se com Istvan Thoman, aluno de Liszt. Durante trinta anos, Bartók lecionou piano no Conservatório de Budapeste, consolidando a fama de excelente pedagogo. Dos três concertos que escreveu para o instrumento, estreou os dois primeiros, sendo o nº 1 sob a regência do célebre Wilhelm Furtwängler. Com o grande êxito do Segundo Concerto, despediu-se do público alemão. O Concerto nº 3, escrito no exílio norte-americano, foi sua obra derradeira.

 

No Concerto nº 1 triunfam os aspectos percussivos do pianismo de Bartók: sonoridades violentas, agregações de ásperos blocos substituindo os acordes tradicionais e um mecanicismo insistente. No todo, trata-se de uma resposta bastante pessoal – e ainda hoje muito impactante – aos apelos neoclássicos e construtivistas de sua época.

 

No primeiro movimento, Allegro moderato, o uso do ostinato torna-se fonte de enorme energia propulsora. Em vários momentos o piano se inclui entre os demais instrumentos de percussão, formando com eles um todo bem distinto.

 

No Andante central, em forma A-B-A, as cordas se calam. Trata-se de uma meditação sóbria e profunda. O piano, de início, dialoga com a percussão. Na seção B central, o solista repete um desenho obstinado que serve de fundo ao crescendo dos sopros, libertos em extraordinária politonalidade. Sem transição, grotescos glissandos dos trombones introduzem o terceiro movimento.

 

O Allegro molto final apresenta seu primeiro tema sobre um ostinato das cordas. As outras ideias se relacionam com o material temático do primeiro movimento. Os motivos são breves, descontínuos e episódicos. Repleta de élan rítmico, a atmosfera é viva e animada.

 

Aos dezoito anos, Bartók começou a estudar metodicamente as manifestações musicais populares de seu país. Estendeu suas pesquisas pelo Leste europeu, chegando ao Norte da África e à Turquia. Seu método de trabalho implicava uma ética – o respeito pelas diferentes etnias e a superioridade do humanismo sobre o nacionalismo. O compositor recolheu, classificou e analisou milhares de canções, em busca de procedimentos musicais comuns às diversas culturas camponesas. Assimilou a surpreendente riqueza rítmica do folclore (em seus compassos inusitados) e libertou-se da hegemonia do sistema tonal pelo uso sistemático de modos e escalas seculares.

 

Paralelamente às pesquisas de etnomusicologia, Bartók elaborou uma síntese original de certos aspectos do cânone da música ocidental. Reconhecia-se tributário, sobretudo, da influência de três grandes compositores: Debussy, Beethoven e Bach. Ao recuperar e incorporar elementos primitivistas à melhor tradição erudita europeia, Bartók contribuiu decisivamente para a renovação da linguagem musical contemporânea, tornando-se, incontestavelmente, um dos compositores mais inovadores e influentes do século XX.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.

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