Richard STRAUSS
(1889)
Instrumentação: 3 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, cordas.
Richard Strauss é hoje considerado, com Gustav Mahler, um dos maiores representantes do romantismo alemão pós-Richard Wagner. No século XIX, o que os alemães tinham como “Grande Arte” era a música sinfônica, em oposição à música operística italiana e ao estilo cosmopolita parisiense. Para os alemães, a tradição musical germânica iniciava-se em Johann Sebastian Bach (então conhecido como autor essencialmente de música instrumental) e compreendia as obras de Haydn, Mozart, Beethoven, Schubert, Mendelssohn, Schumann, Brahms e Wagner (os dramas musicais wagnerianos eram considerados óperas no espírito sinfônico de Beethoven).
Nos anos 1890 a 1910, Strauss, Max Reger e Arnold Schoenberg eram os compositores mais inovadores da música germânica (Mahler, à época, era aceito primordialmente regente de sucesso, e não como grande criador). No entanto, a partir de 1910, o idioma musical tornou-se de tal forma complexo que esses compositores precisaram escolher os caminhos que tomariam: Strauss (Der Rosenkavalier, 1911) e Reger (Variações Mozart, 1914) recuaram e voltaram-se para a música tradicional, enquanto Schoenberg (Pierrot lunaire, 1912) deu um passo para entrar na música contemporânea.
As primeiras composições de Richard Strauss foram para solistas e pequenos grupos. Nos anos 1880 iniciou a fase das composições orquestrais, em que se inserem seus poemas sinfônicos. Compôs dois ciclos de poemas sinfônicos. O primeiro, nos anos 1880, compreende os poemas da juventude (Macbeth, Don Juan e Morte e transfiguração), época em que o compositor estava imbuído da doutrina de Schopenhauer. O segundo, nos anos 1890, compreende os poemas da fase madura (Till Eulenspiegel, Assim falou Zaratustra, Don Quixote e Uma vida de herói), quando Strauss afastou-se da visão metafísica de Schopenhauer e abraçou a doutrina ateísta de Nietzsche.
O poema sinfônico é um gênero orquestral em que um poema ou um programa fornecem a base para a narrativa musical. Mesmo tendo esse ponto de partida, a obra musical deve ser consistente e perfeita em si, e nunca dependente do texto literário. Em outras palavras, independentemente do fato de ter sido, ou não, inspirada por uma ideia extramusical, a boa música deve conter, em si, uma lógica musical que não necessite de apoios externos. Assim são os poemas sinfônicos de Richard Strauss.
Morte e transfiguração foi escrito em 1888/1889. Até esse momento os conhecimentos musicais de Strauss eram estritamente clássicos. Nas palavras do compositor: “eu cresci apenas com Haydn, Mozart e Beethoven, e cheguei até Brahms através da música de Mendelssohn, Chopin e Schumann”. Só em 1885 ele foi apresentado às obras de Liszt e Wagner e à doutrina de Schopenhauer, pelo compositor Alexander Ritter.
Morte e transfiguração busca revelar, através da música, os últimos momentos de vida de um artista, sua batalha para manter-se vivo, suas lembranças e sua chegada ao outro mundo. Uma vez pronta a obra, Strauss pediu a Ritter que escrevesse um poema explicitando as ideias que tinham inspirado a composição. O poema, que deveria ser impresso junto à partitura, serviria como uma espécie de guia para o ouvinte. Strauss regeu a primeira audição no dia 21 de junho de 1890, no Festival de Eisenach. A apresentação apenas confirmou a carreira de sucesso do compositor, que se iniciara dois anos antes, com Don Juan.
Guilherme Nascimento, compositor, professor da UEMG e da FEA, autor dos ensaios “Os sapatos floridos não voam” e “Música menor”