La Clemenza di Tito: Abertura, K. 320

Wolfgang Amadeus MOZART

Na música, a “faxina” que o espírito iluminista do século XVIII se propôs a promover na linguagem excessivamente complexa do Barroco se trata, por um lado, de um movimento de reação, por outro, de um trabalho de redimensionamento de elementos que o próprio Barroco gerou ou conquistou. Assim, certos gêneros ou procedimentos musicais que têm sua origem no período anterior são conservados pelo Classicismo Musical, que os trata à sua maneira, conservando-lhes princípios fundamentais. A própria ideia de melodia acompanhada, em substituição a uma polifonia extremamente prolixa, embora abraçada fortemente pelo Classicismo – que faz dela um de seus principais paradigmas –, nasce efetivamente no Barroco, associada à ópera, que tem também aí o seu berço. No Classicismo, conservam-se da ópera os procedimentos fundamentais. No entanto, embora aí os seus trechos puramente instrumentais sejam menos explorados, a “Abertura” se mantém importante e passa a ser tratada com maior cuidado, trabalhando tematicamente os elementos que no decorrer do enredo serão apresentados pelas partes vocais.

 

Outros gêneros, porém, que têm origem no Barroco, são relidos pela linguagem clássica, que lhes dá nova roupagem associando-os não raro a procedimentos de sua própria predileção: o concerto grosso (em que a parte solista é compartilhada por dois ou mais instrumentos), um dos ícones da música instrumental do Barroco, muitas vezes aparece, aí, travestido em sinfonia. A Sinfonia Concertante, assim, associa, a uma estrutura fundamental, clássica por natureza (a Forma Sonata), o procedimento básico do concerto grosso: o de opor dois ou mais instrumentos solistas ao todo da orquestra.

 

Das cerca de vinte e três óperas compostas por Mozart, La Clemenza di Tito foi escrita num período de intensa atividade, que produziu, dentre obras instrumentais importantes, também Così fan tutte e A Flauta Mágica. Estreada em Praga em 1791, La Clemenza di Tito foi composta nesse mesmo ano, quando já se encontrava avançado o trabalho com A Flauta Mágica. Essa opera seria, com libretto de Catterino Mazzolà (baseado em outro libreto, de Metastasio), trata da vida de Tito, imperador romano, e alcançou grande popularidade, mesmo após a morte de Mozart. Sua abertura segue os padrões consagrados pela ópera clássica, em que os elementos temáticos que mais tarde tomarão lugar no drama já são insinuados, e elaborados, aqui, de forma a introduzir o perfil dramático do enredo da obra.

 

Moacyr Laterza Filho
Professor na Universidade do Estado de Minas Gerais e na Fundação de Educação Artística

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