Giacomo Puccini
No último quartel do século XIX, o Verismo, corrente literária de princípios realistas influenciada pelo Positivismo e o Naturalismo francês, surge na Itália. A partir de 1890, com a estreia de Cavalleria Rusticana de Pietro Mascagni, esses princípios estéticos passam a dominar o cenário operístico italiano. Marcado pelo realismo, as óperas veristas preferem as descrições da vida cotidiana, principalmente das classes sociais mais baixas, aos temas históricos, míticos e grandiosos que caracterizaram o Romantismo. Puccini, que na última década do século XIX, com Manon Lescaut (1893) e La Bohème (1896), irá se celebrizar como operista, acaba por aderir ao movimento.
Giacomo Antonio Domenico Michele Secondo Maria Puccini descende de uma importante família de músicos italianos da cidade de Lucca. Por várias gerações, os organistas da igreja de São Martinho em Lucca foram os Puccini. Seu pai, Michele Puccini, organista responsável pela igreja de São Martinho, começou muito cedo a lhe dar aulas de órgão. Porém, quando Giacomo contava seis anos seu pai faleceu. Não obstante sua tenra idade, o governo municipal de Lucca decretou que, devido à tradição, Giacomo Puccini herdaria o cargo de seu pai. Aos dezoito anos, Puccini vai a Pisa com seu irmão e lá assistem a uma apresentação da ópera Aida, de Verdi. Naquele momento Puccini dá uma guinada em sua vida profissional. Ao se apaixonar pelo universo das óperas, abandona o cargo de organista e ingressa no Conservatório de Milão, onde estuda com Amilcare Ponchielli e Antonio Bazzini. Sua primeira ópera estreou em 1884, Le Villi, e atraiu a atenção do importante editor Giulio Ricordi, que lhe encomendou sua segunda ópera, Edgar (1889). Nenhuma das duas obteve sucesso. O apoio de Ricordi, quase incondicional, mas a contragosto da família, foi fundamental para que Puccini continuasse no meio operístico e, após a estreia de sua terceira ópera, Manon Lescaut, de enorme sucesso, Puccini consagrou-se, de vez, como um respeitável compositor de óperas.
O nome de Puccini é muito pouco associado à música sinfônica, porém, sua palheta orquestral é de inegável riqueza, considerada por alguns maior até do que sua veia melódica. Duas de suas obras de juventude para orquestra são frequentemente ignoradas: o Prelúdio Sinfônico, escrito em Lucca em 1876 e que permaneceu inédito até 1977; e seu Capriccio Sinfonico. Esta última foi apresentada por Puccini quando de sua graduação no Conservatório de Milão, em 1883. Publicada inicialmente em 1884 em forma de redução para piano a quatro mãos, foi editada em sua versão integral somente em 1978, graças a Pietro Spada, a quem se deve também a publicação doPrelúdio Sinfônico. O Capriccio sinfonico já apresenta o que virá a ser considerado por muitos o stile pucciniano, que busca unir a tradição da melodia italiana à elaboração temática e orquestração wagnerianas. Tal o brilho de sua orquestração que a obra parecia prenunciar um grande compositor de sinfonias. Puccini soube, porém, levar para as óperas seu amplo conhecimento orquestral. Já em sua estreia, em 16 de julho de 1883, o Capriccio Sinfonico fizera muito sucesso. Franco Faccio, diretor da orquestra do Scala de Milão e um dos mais importantes diretores italianos da época, após haver regido a estreia, incluiu-a na programação de sua orquestra no ano seguinte. Puccini utilizou algumas das passagens do Capriccio em Le Villi, em Edgar e também uma das mais famosas citações do Capriccio em La Bohème.
Igor Reyner
Pianista, Mestre em Música pela UFMG, doutorando de Francês no King’s College London e colaborador do ARIAS/Sorbonne Nouvelle Paris 3.