Sinfonia nº 1 em Dó maior

Georges Bizet

(1855)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, tímpanos, cordas.

 

O talento de Georges Bizet como pianista era tão grande que ele poderia ter seguido uma carreira de grande sucesso como solista. Liszt o ouviu tocar na casa de Halévy, em maio de 1861, e afirmou que o jovem de vinte e dois anos era mais talentoso que ele próprio. Mas Bizet preferiu a carreira de compositor. Em sua breve existência, acumulou mais fracassos que êxitos e praticamente desconheceu o sucesso. Sua ópera mais conhecida, Carmem, tornou-se obrigatória no repertório operístico, mas apenas após a sua morte. Para ganhar a vida dava aulas particulares de piano, tocava em ensaios de óperas e realizava arranjos de obras consagradas a pedido dos editores. Sua história é uma história de luta, de incessante busca por reconhecimento.

 

Seu amigo, o compositor Camille Saint-Saëns, exclamou a respeito de Bizet: “Por que esse músico encantador, esse rapaz amável e alegre, encontrou tantos obstáculos em seu caminho?”. Ao contrário de Saint-Saëns, que se voltou para a música de concerto quando a crise se instaurou nos teatros franceses, Bizet acreditava que possuísse talento apenas para a ópera. De fato, suas incursões na música instrumental foram poucas, quase que somente com a intenção de aprendizado de orquestração e forma. A sua Sinfonia no 1 é um desses casos.

 

Bizet tinha apenas dezessete anos e era ainda aluno do Conservatório de Paris quando compôs sua Primeira Sinfonia, tendo, como modelo, a Sinfonia no 1 de Charles Gounod, seu professor. Naquele ano ele havia realizado o arranjo da sinfonia de Gounod para dois pianos e se familiarizado com a obra do mestre.

 

O primeiro movimento (Allegro vivo) abre-se com um motivo breve de três notas. A tensão que permeia todo o movimento é tipicamente mozartiana. O tema principal do segundo movimento (Adagio) é uma triste melodia escrita para o oboé, que Bizet mais tarde aproveitaria na ópera Os pescadores de pérolas, na ária De mon amie, da personagem Nadir. As duas seções do terceiro movimento (Allegro vivace), Scherzo e Trio, à moda de Gounod, são construídas em cima de um mesmo tema, ouvido logo no início do movimento. O finale (Allegro vivace) é alegre e exuberante. Possui, já, o colorido orquestral tão característico da obra futura de Bizet.

 

Bizet não fez esforço algum para conseguir que sua Primeira Sinfonia fosse executada. Muito provavelmente tratava-se de um trabalho da classe de composição. Após a sua morte, a obra ficou esquecida. Em 1933, o musicólogo francês Jean Chantavoine descobriu o manuscrito na Biblioteca do Conservatório de Paris. Felix Weingartner regeu a primeira audição, em 26 de fevereiro de 1935, na Basileia. Embora se trate de uma obra de juventude, a riqueza melódica e o extraordinário colorido orquestral revelam o formidável talento do compositor. A Sinfonia no 1 de Bizet mostrou-se mais encantadora que aquela que lhe serviu de modelo. Aos poucos entrou para o repertório orquestral corrente, enquanto a sinfonia de seu mestre caía no esquecimento.

 

Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor na Escola de Música da UEMG, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.

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