Sinfonia nº 7 em ré menor, op. 70

Antonín DVORÁK

(1884/1885)

Instrumentação: piccolo, 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, 3 trombones, tímpanos, cordas.

 

Dvorák era descendente de uma geração de açougueiros e donos de pensão. Seu talento para a música foi logo percebido pelo pai, músico amador. No entanto, como Antonín era o mais velho dos nove filhos, o pai preferiu enviá-lo, aos treze anos, à pequena cidade de Zlonice para estudar alemão e aprender o ofício de açougueiro com um tio. Mas o que mais agradou ao jovem Antonín foi poder estudar órgão, piano e viola com seu professor de alemão. Aos dezesseis anos, já de volta à casa dos pais, surgiu o problema da escolha de sua futura carreira: seu pai desejava vê-lo açougueiro, mas o tio e o professor de alemão insistiam em que ele deveria desenvolver seus talentos musicais na capital. O pai finalmente cedeu e Antonín mudou-se para Praga, onde viria a desenvolver uma sólida carreira de organista.

 

Seus anos de estudante não foram fáceis. Dvorák não era um virtuose ou um garoto prodígio. Sua sólida carreira desenvolveu-se lentamente, sem saltos abruptos. Sem suporte financeiro dos pais, que atravessaram enormes dificuldades, ele precisou ganhar a vida como pôde. Como um posto estável de organista fosse difícil de se conseguir, Dvorák tocava violino e viola em pequenas orquestras e completava o salário dando aulas de piano. Sua renda, ainda assim, era pouca, mesmo para os padrões mais modestos. E continuaria escassa pelas décadas seguintes até que, aos trinta anos de idade, ele obteve um posto de organista na Igreja de São Adalberto e pôde abandonar a orquestra. Sua renda não aumentou com essa troca, mas, ao menos, ele conseguiu mais tempo para compor. A composição havia se tornado sua maior paixão. Nos anos 1870 seu nome foi, aos poucos, se tornando conhecido em Praga. Data dessa época seu primeiro encontro com Brahms. O compositor alemão havia sido jurado, com o crítico Eduard Hanslick, de um concurso do governo austríaco destinado a ajudar artistas em início de carreira. Dvorák recebeu o primeiro prêmio por anos seguidos. Hanslick e Brahms, que vinham aprendendo a admirar sua obra, passaram a conhecê-lo melhor, e uma longa e duradoura amizade tinha início para os três.

 

Em 1883 o maestro inglês Joseph Barnby regeu o Stabat Mater de Dvorák em Londres. A Inglaterra, com sua prosperidade de longa data, mantinha um padrão cultural notável, oferecendo notáveis atrações musicais. Embora não tivessem produzido grandes compositores desde Purcell, os ingleses sempre deram oportunidades a compositores europeus para desenvolverem sua arte – como foram os casos de Haendel, Haydn e Mendelssohn. O sucesso do Stabat Mater de Dvorák foi tal que o compositor logo foi convidado para reger suas obras na capital inglesa. No ano seguinte foi a Londres, regeu dois concertos e recebeu a mais calorosa acolhida de sua vida até o momento. Tornou-se membro honorário da Royal Philharmonic Society e recebeu a encomenda de uma nova sinfonia para o ano seguinte. Nascia, assim, a Sinfonia no 7.

 

A composição, iniciada em dezembro de 1884, ficou pronta em apenas três meses, em 17 de março de 1885. A estreia se deu em 22 de abril, no St. James Hall, em Londres, com a Royal Philharmonic Society, sob a regência do compositor. Ele foi ovacionado após a apresentação e a crítica especializada comparou sua Sinfonia no 7 às sinfonias de Brahms. Em junho o autor fez algumas revisões e preparou a obra para publicação. Seu editor, Simrock, o mesmo de Brahms, costumava oferecer-lhe valores menores que os oferecidos ao compositor alemão. Oferecendo-lhe então três mil marcos pela nova Sinfonia, recebeu uma longa carta em resposta, em que Dvorák declarava merecer, ao menos, o dobro: “Por favor, lembre-se de que sou um artista pobre, e um homem de família”. Simrock não teve escolha. Os rumores da apresentação em Londres haviam chegado aos seus ouvidos. Dvorák não era mais um desconhecido compositor do interior. Seu reconhecimento internacional havia começado.

 

Trompas, tímpanos e contrabaixos criam a atmosfera misteriosa que dá início ao primeiro movimento (Allegro maestoso). O primeiro tema é apresentado pelas violas e violoncelos e logo desenvolvido pela orquestra. Após o clímax e sua dissolução, flauta e clarinete apresentam o segundo tema, uma doce melodia de caráter mais vienense que boêmio, lembrando-nos de como o estilo de Dvorák tornava-se, pouco a pouco, um estilo internacional. Fragmentos do primeiro tema dominam a música até o final do movimento, tão misterioso quanto o início.

 

A serenidade do segundo movimento (Poco adagio) nos convida a um momento de tranquila contemplação, antes da agitação do Scherzo. Sua beleza repousa não apenas na qualidade do material musical, como também na maneira imprevisível como ele se desenvolve.

 

O terceiro movimento (Vivace) é um Scherzo. Seu balanço é um convite à dança. A elegância de sua seção central apresenta um contraste belíssimo. O retorno da primeira seção é tão agradável quanto a sua primeira aparição, mas um trágico final nos prepara para o próximo movimento.

 

O Finale (Allegro) é o mais dramático dos quatro movimentos. O primeiro tema é prontamente apresentado pelo clarinete e trompa. As cordas cuidam do segundo tema, em caráter marcial. A música se desenvolve de maneira imponente, sem, no entanto, tornar-se otimista. A grandiosidade dos últimos compassos conserva um pouco do mistério do início da Sinfonia.

 

Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Composição, professor da UEMG, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.

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