Camargo GUARNIERI
(1928/1931/1946)
Instrumentação: 3 flautas, 3 oboés, 3 clarinetes, 3 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, cordas
Compostas em três distintos momentos da carreira de Camargo Guarnieri, as Danças Brasileira, Selvagem e Negra foram consideradas um tríptico, pelo próprio autor. Observa-se, como elemento comum às três danças, o comprometimento do compositor paulista com o ideário nacionalista, traduzido em inspiração nas raízes negras e indígenas. Em entrevista à musicóloga Marion Verhaalen, em 1969, Camargo Guarnieri relaciona sua Dança Brasileira às memórias de infância: “Nasci em uma pequena cidade chamada Tietê. Minha casa se erguia em uma das ladeiras da cidade, construída às margens do rio Tietê. Aqui, no Brasil, comemoramos a abolição da escravatura no dia 13 de maio. Lembro que, quando menino, eu ouvia o ritmo das danças dos negros durante essas comemorações. O ritmo era incessante e minha Dança Brasileira surgiu dessa memória”.
A Dança Brasileira foi um marco no relacionamento de Camargo Guarnieri com o literato e também musicólogo Mário de Andrade, ao qual se aliou na tentativa de criação de uma música “caracteristicamente nacional”. Estudos sobre a trajetória de Camargo Guarnieri endossam, em geral, o parecer de Mário de Andrade acerca do viés nacionalista do compositor paulista e, mais ainda, têm enfatizado a influência de Mário nas opções estéticas de Camargo Guarnieri. Verifica-se, como ponto convergente dos pensamentos de Camargo Guarnieri e Mário de Andrade, uma compreensão do nacional como resultante da fusão de diferentes elementos da história brasileira – europeus, africanos, indígenas. Cada um desses componentes, por sua vez, incluía outros tantos aspectos culturais, tais como etnia, religiosidade, linguagem, tecnologia e modos de ser. Mais do que reproduzir um ideário letrado, Camargo Guarnieri formulou, ao longo dos anos, um projeto singular, apropriando-se, sem dúvida, das concepções de Mário de Andrade, mas não se limitando a elas. De caráter alegre e ritmado, em “Tempo di Samba”, a Dança Brasileira (1928) foi composta, como as demais danças deste programa, originalmente para piano e, posteriormente, transcrita para orquestra, ganhando mais brilho e diversificação pela instrumentação de seus temas.
Já a Dança Selvagem (1931), como o próprio título sugere, traz elementos sugestivos das florestas brasileiras e a inclusão de ritmos gravados por Roquette Pinto em pesquisas etnográficas pelo interior do Brasil. A peça é marcada pelo caráter agitado, culminando com a tensão final, em alto grau de intensidade, por toda a orquestra.
Quinze anos mais tarde, Camargo Guarnieri compôs a Dança Negra (1946), concebida após uma viagem com Jorge Amado à Bahia. Camargo Guarnieri assistiu a uma cerimônia de Candomblé, ocasião em que observou, ao se encaminhar para o local, que se ouviam ao longe batuques e cantos os quais se intensificavam extremamente à medida da aproximação. Inspirado nessa experiência, Guarnieri criou a terceira Dança que se inicia com uma melodia acompanhada por ostinato em pianíssimo, chega ao clímax em fortíssimo e retoma o pianíssimo para finalizar.
Cesar Buscacio
Pianista, Mestre em Música e Educação, Doutor em História Social, professor da Escola de Música da Universidade Federal de Ouro Preto.
Olho:
A Dança Brasileira foi um marco no relacionamento de Camargo Guarnieri com o literato e também musicólogo Mário de Andrade, ao qual se aliou na tentativa de criação de uma música “caracteristicamente nacional”.