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A estreia de Madama Butterfly, em fevereiro de 1904, foi um dos maiores fiascos da história da ópera. Há quem credite o desastre à ambientação e à sonoridade orientais construídos por Puccini, que seriam “exóticas” demais para o público europeu; outros defendem que foi a simpatia com a qual ele retrata a sua heroína, a jovem gueixa Cio-Cio-San, em detrimento do marido, o tenente norte-americano Pinkerton. Fato é que a plateia reagiu com nítida reprovação, vaiando ao longo de todo o espetáculo. Constrangido, Puccini retirou a ópera de cartaz imediatamente, dividiu o longo primeiro ato em dois, deu uma nova ária a Pinkerton e fez ajustes gerais em toda a peça. A segunda apresentação, ocorrida três meses depois, em Brescia, foi um sucesso gigantesco. Madama Butterfly, desde então, nunca mais deixou os palcos das casas de ópera.
A história se passa em Nagasaki, Japão, no início do século XX. Pinkerton, oficial da marinha americana, por intermédio do agente matrimonial Goro, realiza um contrato de “casamento temporário” com Cio-Cio-San, uma gueixa de 15 anos conhecida também como Butterfly. Apesar das advertências do cônsul Sharpless, Pinkerton abandona a esposa pouco tempo depois, sem saber que ela estava grávida. Inocentemente, a jovem Butterfly continua acreditando no retorno do marido, mesmo depois de ter sido amaldiçoada pelo tio e de recusar a proposta de casamento do rico Yamadori. Anos mais tarde, Pinkerton retorna para buscar o filho acompanhado de Kate, sua nova esposa. Ele pede que a criada Suzuki chame Butterfly, mas, sem coragem para encarar aquela que deixou, parte antes de revê-la. À Kate, Cio-Cio-San afirma que entrega a criança, mas apenas se Pinkerton vier pessoalmente. Em seu âmago, sozinha e profundamente desiludida, decide que prefere morrer a viver em desonra. Quando Pinkerton retorna para, enfim, buscar o filho, descobre que Butterfly se matou usando o mesmo sabre usado pelo pai para cometer suicídio.
Com um arco trágico, que parte da inocência juvenil com o amor conjugal para se encerrar com uma decisão drástica, mas autônoma e bem resolvida, Cio-Cio-San é uma das protagonistas mais marcantes de todo o repertório. Puccini possuía o talento raro de nos fazer “sentir com” as suas personagens, de nos levar a entender o que as aflige e o que motiva as suas ações, e é essa abordagem sentimental que torna Madama Butterfly um drama tão comovente. Em termos musicais, a ópera expande a paleta sonora pucciniana com seus temas e ambientações inspiradas no Japão, mas mantém as melodias concisas e memoráveis que definem a tradição da ópera italiana. A orquestração é brilhante e muito original, como é característico deste grande compositor. Assim como as demais óperas escritas por Puccini, Madama Butterfly é coração puro: do encanto à decepção, pela ternura e pela sensualidade, do egoísmo ao arrependimento, trata-se de uma obra que aflora as emoções do ouvinte e o convida a sentir, bem de perto, tudo aquilo o que as personagens estão sentindo.