Bachianas Brasileiras nº 5

Heitor VILLA-LOBOS

(1938/1945)

Instrumentação: Violoncelos.

 

Em 15 de junho de 1930, Villa-Lobos desembarcava no Rio de Janeiro, chegando de sua segunda estada em Paris. Encorajado pelas recentes apresentações de suas obras na Europa, o compositor planejava uma curta temporada de concertos no Brasil e um breve retorno à capital francesa. O que ele não sabia na época é que, exceto por uma brevíssima visita a Praga, Berlim e Barcelona em 1936, ele só voltaria à Europa em meados da década seguinte. A Revolução de 1930 afetaria a vida de todos no país. A vida cultural definhou e Villa-Lobos perdeu o patrocínio que os irmãos Guinle lhe deram por tanto tempo. O sucesso não bastava para lhe garantir uma existência tranquila e, aos 43 anos de idade, encontrava-se sem dinheiro e sem condições de ganhar a vida. Mas a mesma situação que lhe tirou o patrocínio e lhe impedia de retornar à Europa acabaria por ser-lhe extremamente benéfica. Com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder e o gradual aumento das tendências nacionalistas, Villa-Lobos se engajou em um projeto de educação musical que iria abranger todas as escolas do país e que lhe manteria ocupado por uma década e meia. Além de compor peças didáticas e cuidar das aulas de canto nas escolas, era dever de Villa-Lobos elevar o padrão da educação musical no Brasil. Sobrava pouco tempo para compor e promover a carreira. Das obras desse período, merece especial destaque a série das Bachianas Brasileiras, compostas entre 1930 e 1945.

 

Muito se perguntou sobre o título Bachianas Brasileiras. Nos anos 1930, Villa-Lobos havia abandonado quase por completo a música moderna e aderira à nova moda musical europeia, o neoclassicismo. Esse termo genérico se referia a uma prática surgida no final dos anos 1920 e início dos 1930, onde era frequente o uso de técnicas composicionais herdadas dos séculos anteriores, não apenas do período Clássico, como sugere o nome, mas também do Barroco e Romantismo. Na época, praticamente todo grande compositor europeu aderiu ao neoclassicismo, e Villa-Lobos não ficou para trás. O termo Bachianas Brasileiras é uma alusão à combinação de elementos étnicos brasileiros com a técnica composicional de Johann Sebastian Bach, compositor preferido de Villa-Lobos. Trata-se de um conjunto de nove obras definitivamente maravilhosas, mas que, na verdade, guardam poucas relações entre si ou com o estilo composicional bachiano. Por que, então, Villa-Lobos agrupou obras tão disparatadas sob um mesmo título? Talvez porque ele soubesse bem que obras com o mesmo título tendem a se fixar mais facilmente na memória do público, uma vez que criam um universo fechado. E obras com títulos diferentes tendem a se dispersar por não se remeterem a um conjunto pré-definido. E de fato, sempre que falamos de uma das Bachianas Brasileiras, pensamos invariavelmente nas outras.

 

As Bachianas Brasileiras nº 5, originalmente para soprano e oito violoncelos, é composta de dois movimentos: Ária (Cantilena) e Dança (Martelo). A famosa Ária, peça mais conhecida de Villa-Lobos mundo afora, foi composta em 1938, sobre texto de Ruth Valadares Corrêa, e estreada em 25 de março de 1939, no Rio de Janeiro, com a própria Ruth Valadares sob a regência de Villa-Lobos. A Dança foi composta apenas em 1945, sobre texto de Manuel Bandeira. A versão completa das Bachianas Brasileiras nº 5 foi estreada no dia 10 de outubro de 1947, em Paris, com a soprano Hilda Ohlin e regência do compositor. Neste mesmo ano, Villa-Lobos faria ainda uma versão da Ária, para soprano e violão e, em 1948, da obra completa, para soprano e piano.

 

Guilherme Nascimento
Doutor em Composição, professor de Música da UEMG e da Fundação de Educação Artística, autor do livro Música menor.

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