Heitor VILLA-LOBOS
Instrumentação: piccolo, 2 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, contrafagote, 4 trompas, 3 trompetes, 4 trombones, tuba, tímpanos, percussão, celesta, harpa, cordas.
Em 1923, Villa-Lobos dava um passo importante em sua carreira, trocando o Rio de Janeiro por Paris, a metrópole das vanguardas artísticas. Na voga de exotismo selvagem que dominava a capital francesa, os traços de primitivismo e energia telúrica presentes em sua música foram comparados às recentes ousadias musicais de outros ícones da modernidade. Chamado por Florent Schmitt de néo-sauvage, Villa-Lobos assumiu o papel de “compositor dos trópicos” e normatizou sua estética nacionalista, sob a premissa de que a verdadeira música brasileira formara-se nos ambientes populares – indígenas, folclóricos, rurais ou urbanos. Por outro lado, soube avaliar o potencial dessa música como contribuição singular para o panorama musical internacional, associando-a aos procedimentos composicionais eruditos característicos do século XX. O conjunto dos Choros, compostos na década de 1920, demonstra a preocupação do compositor com a modernidade.
De volta ao Brasil, em 1930, Villa-Lobos exerceu uma atividade abrangente no cenário musical do país, desdobrando-se em múltiplas tarefas – estímulo ao ensino musical, criação de grupos de canto coral, organização e regência de concertos. E continuava compondo muito. As nove Bachianas foram compostas entre 1930 e 1945, época da ascensão política dos Estados totalitários e das duas grandes guerras. Nas artes, houve grandes desvios nos rumos das vanguardas do início do século, que agora substituíam a irreverência e as ousadias das décadas anteriores por uma tendência à institucionalização. Esse retorno à ordem corresponde à fase neoclássica de artistas cuja fama inicial associara-se a escândalos iconoclastas. No neoclassicismo de suas Bachianas, Villa-Lobos referencia, na figura de Bach, a tradição ocidental, procurando afinidades entre alguns procedimentos brasileiros e a música do grande gênio alemão. Assim, os movimentos das Bachianas trazem, geralmente, dois títulos – um que remete às formas barrocas e outro, bem nacional, seresteiro, sertanejo.
A Bachiana Brasileira nº 7 foi composta em 1942 para grande orquestra e um conjunto de instrumentos brasileiros de percussão. Dedicada a Gustavo Capanema, divide-se em quatro movimentos:
. O Prelúdio (Ponteio), melódico e sentimental, em Adagio, inicia-se com pizzicatos, alternados entre os primeiros e os segundos violinos, evocativos do acompanhamento dos violões seresteiros, preparando a entrada do tema principal, exposto pelo fagote e respondido pelo oboé.
. A Giga (Quadrilha caipira) evoca uma dança sertaneja, em fugato. O ritmo caracteriza-se por um acento desarticulado, deslocado do tempo forte dos compassos.
. A Toccata (Desafio) sugere um duelo de repentistas nordestinos. O desafio, estabelecido entre um trombone e um trompete, em surdina, acontece sobre harmonias dissonantes de um acompanhamento à maneira de violas rústicas.
. A Fuga (Conversa), a quatro vozes, com um tema principal bem brasileiro, é bastante livre, pouco escolástica, apesar do perfeito equilíbrio de estilo. Uma Coda, em andamento Lento, relembra alguns temas, sobre um pedal de tônica que conduz a peça até a majestosa cadência final.
A Bachiana nº 7 estreou no Rio de Janeiro em março de 1944, sob a regência de Villa-Lobos.
Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.